quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

The Depression Diaries, nº02 - Cansaço e outras coisas

Bem, sobrevivi ao natal. Não foi lá dos melhores, mas já tive piores. Eu tenho só 19 e às vezes o peso em minhas costas faz com que eu sinta que tenho 2000 anos. E sim, eu estou muito cansada. Um cansaço físico e emocional que tem ultrapassado todos os meus limites. Infligi-se a dor física para que ela possa superar a dor emocional de alguma maneira, pois ela é quase sufocante a maior parte do tempo. Tudo tem sido uma legal, mas eu continuo uma merda. Tenho me sentido ultimamente de um jeito que, na verdade, eu acho que sempre me senti. Eu não tenho lugar neste mundo, por mais que eu possa percorrer o planeta de ponta a ponta.

Realmente não sei como eu pretendo finalmente descobrir quem sou e me aceitar de tal jeito. Sinto um vazio que não se preenche nem com 200 amigos, nem com mais de trinta séries e milhares de filmes, nem com frequentar um lugar diferente por dia e conhecer dezenas de pessoas diferentes. Mas ainda assim eu não quero ficar aqui. Se eu ficar aqui no Ano Novo eu vou enlouquecer. Juro. Não aguento mais um Réveillon em casa. Não aguento mais estar dentro da minha própria cabeça. É como andar por aí carregando um piano nas costas enquanto todo mundo te olha achando que é perfeitamente normal. Não sei se o remédio vai conseguir algum dia me ajudar. Eu não sei de mais nada. Só sei que vou dormir o quanto puder, pois é quando tenho um pouco de paz interior. 

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

The Depression Diaries, nº01

R.W. Shepherd escreveu certa vez: "Você lida com a depressão da mesma maneira que você lida com um tigre." Soa meio tolo quando a voz dentro da minha cabeça que maquina o dia inteiro diz que se tudo isto não passasse de uma luta com um felino, eu já teria dado o meu jeito de pensadora ágil para me livrar de tal problema; eu nunca me escondi diante de qualquer duelo, exceto quando ele se passa dentro da minha cabeça. Meu nome é Jaciara Macedo, tenho 19 anos e uma depressão há 11 meses.

A maioria das pessoas (inclusive minha genitora) acham que é possível ter certo domínio sobre minha doença (utilize o plural pois lembro-me agora que também tenho transtorno de ansiedade) ou sobre qualquer ação ou atitude que ela venha a me induzir a fazer. Eu faço merda. Eu afasto as pessoas que amo. Eu sempre me desaponto. Esse é meu carma, minha condição, minha história que se repete desde os primórdios de 1993 quando eu já vim a este mundo chorando e gorda. Até hoje eu não sei muito bem como entrei nisso, mas o que realmente importa é que não sei como sair desse estado depressivo. Será que acontece do mesmo jeito que a extinção dos dinossauros? Algum dia tu acorda, olha pro céu e vê um meteorito vindo na sua direção e PLAF! Tudo desaparece. Não que eu esteja desejando o fim do mundo, apenas o da minha dor.

Tenho passado os últimos dois dias bem. Depois da segunda consulta com minha psicóloga — a pessoa que me incentivou a escrever isso aqui — e após uma conversa franca com minha mãe, eu tenho posto as coisas numa perspectiva que talvez seja difícil de explicar, entretanto soa claro e pacificador na minha cabeça. E ao mesmo tempo, é desesperador. Por que eu sei que essa paz interna não vai durar tanto quanto eu gostaria nem me alimentar tanto quanto eu preciso. É como ser e viver numa montanha russa de tudo e mais um pouco, na qual em determinada parte do trajeto eu seja uma porra louca (ou velha louca, como Thyara diria) que só quer viver e viver e nos trilhos mais a frente eu me sinto sufocada num lago negro com tudo o que há de ruim ou como eu carinhosamente gosto de chamar, "minha mente".

Ainda estou tomando Pondera, 10mg. Meu psiquiatra resolveu trocar meu remédio por ele não estar fazendo o efeito que ele esperava que fizesse, e agora começarei a tomar Zoloft. Eu espero que realmente me ajude. Minha mãe me diz para tentar sair disso tudo sem a ajuda de medicação, entretanto eu não acho que isso seja possível. Eu tentei por tantos meses que ela nem ao menos desconfia. Esperar até a madrugada, quando todos estão dormindo, para chorar pelo dia inteiro; querer morrer todas as vezes ao abrir os olhos; odiar tanto você mesma que não consegue suportar sua própria existência. 2012 foi o ano em que eu quebrei, a mim mesma e aos outros. Sinceramente cansativo.

Eu tenho conseguido não dar a mínima para certas coisas. Às vezes, enquanto na internet ou em outro lugar qualquer, eu quase sinto toda aquela tristeza que fica como uma nuvem negra ao redor de mim apenas esperando o momento certo de atacar. É notório que eu já estive pior do que estou atualmente, mas as férias se aproximam e ficarei sozinha novamente. Para piorar, será fim de ano. Natal sozinha, Ano Novo sozinha. Todos aqueles sentimentos vão voltar, eu apenas sei. É um prato cheio para eles que tenha toda a discografia do Joy Division no computador. 

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

O Nash que nunca fui

Ainda não sei muito bem como definir esse ano em uma palavra. Eu nem mesmo sei como cheguei até aqui viva.  Não de modo figurativo, literalmente. Apesar de eu reclamar de muita coisa errada que há em minha vida, eu devo a muito a certas pessoas, inclusive a minha estada aqui. Eu não sei por quê eu sou do jeito que eu sou. Eu escrevi tanto sobre amor no ano anterior e tudo o que sobrou para este foram todas as coisas sombrias em mim que se esconderam debaixo de tudo o que eu pensei que teria a obrigação de me sustentar. É tão horrível estar na minha cabeça a maior parte do tempo. Às vezes tenho medo de ser assim para sempre, tenho medo de perder minha sanidade, tenho medo de dar qualquer passo que me pareça em falso. Eu tenho tantos amigos que não acreditam mais em Deus, e no entanto eu ainda consigo me agarrar a Ele quando me vejo na mais profunda escuridão. Se Deus existe mesmo, por que ele acha que eu seria capaz de suportar tanta coisa que venho suportando? São tantas perguntas sem resposta, aparentemente destinadas a  me acompanhar até o túmulo. 

Questiono-me quando foi que comecei a ter medo da minha própria mente, que já foi o lugar mais seguro do mundo pra mim. Quando em The Sun Also Rises alguém pergunta a Mike Campbell como ele ficou falido, ele apenas responde "gradualmente, e então de repente". De repente eu me vi assim. De repente eu não sabia mais o que fazer, para onde ir. De repente eu comecei a ter medo do que eu poderia fazer comigo mesma. Como confiar nas pessoas se elas estão sempre nesse ritmo frenético de chegada e partida que é mais curto dos que os casamentos nos dias de hoje? E novamente, o medo da insanidade me invade; e mais do que tudo o medo de ser um fardo ainda maior para aqueles forçados a cuidar de mim. Tenho medo de não conseguir mais escrever e com isso me tornar uma kamikaze descontrolada, uma bomba relógio sem hora certa de explodir. Esse ano acabou para mim mesmo antes de chegar em sua metade, e desisto sem remorso de que dele saia alguma coisa boa. Minha fraqueza e covardia escolheram o caminho mais fácil para mim; assim me jogaram dentro de um poço que não tem fim como os campos verdes que vão além do horizonte e além do que nossa vista pode alcançar, que é onde a magia acontece. Gostaria que cada um de vocês pudesse ver o mundo através dos meus olhos — com todas as suas cores e nuances e misturas e loucuras — e me desligar de mim como se eu fosse um robô a quem o cientista desliga pressionando um botão nas costas. Come with me... And you'll be in a world of pure imagination. Parte de mim ainda espera ser resgatada para o mundo ao qual pertenço, como se tivesse sido roubada de um universo paralelo e tudo aqui — no fundo, eu sei — me fosse estranho. Todavia, eu sempre soube que havia nascido quebrada, daquele jeito que não há cola forte no mundo o suficiente para consertar. Parece-me inútil, todos vão rir.

"To be nobody but yourself — in a world which is doing it's best, night and day, to make you everybody else — means to fight the hardest battle which any human being can fight: and never stop fighting." e.e. cummings 

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Ter um pau não te obriga a ser um cretino.

Sabe quando você vai dormir e liga a TV do quarto só pra te fazer uma companhia breve antes de cair no sono e está passando um daqueles filmes da madrugada e quando você vê, já tá completamente envolvido pela história do filme obrigando-se a assistir até o final? Foi mais ou menos assim que me o jornalismo político surgiu para mim. Talvez seja a área da profissão que mais me interesse atualmente juntamente com jornalismo literário, no entanto o interesse na política fica um passo a frente quando descobri que ele mexe com ideais que nem eu mesma sabia que tinha.

Eu nunca me considerei feminista. Nunca usei tal termo pra me definir ou definir minhas idéias. As pessoas, mesmo atualmente, têm um conceito muito errôneo quando se fala disso. Basicamente, acham que ser feminista é odiar os homens e morrer virgens e sozinhas e lutando pelos direitos das mulheres. Muitos ainda pensam assim, o que me enche de pena. Não precisa ser feminista para querer respeito, basta ser mulher. Mas voltemos ao que me fez começar esse texto.

Lia algumas coisas relacionadas à campanha política americana — Barack Obama e Mitt Romney concorrem pela presidência — quando vi uma notícia sobre o Paul Ryan, vice do Romney, em que ele dizia que estupro é só mais um "método de concepção" e que nem mesmo nessa situação o aborto deve ser permitido.



É pensamentos como esse que nos mantém numa era paleozoica em que as pessoas têm a audácia de apontar o dedo para uma menina ou uma mulher que sofreu esse tipo de violência e dizer que foi ela que pediu por isso, que foi ela que se vestiu de tal jeito que fez com que quisessem estuprá-la e agora que ela engravidou disto, que arque com seus atos. É por causa disso que muitas mulheres escolhem permanecer caladas após um crime horrível como este. Kurt Cobain disse certa vez "Estupro é um dos crimes mais terríveis da Terra. E isso acontece a cada poucos minutos, o problema com os grupos que lidam com o estupro é que eles tentam educar as mulheres sobre como se defender. O que realmente precisa ser feito é ensinar os homens não estuprar. Vá à fonte e começe por aí." Exatamente. Porque quando uma garota diz "não" pra um cara, mas ela está bêbada pra caramba e mal conseguindo andar, ele acha que é certo ir lá e forçá-la a um sexo que ela não quer. Sério, você homem que acha que isso é certo, releia o que acabei de escrever e veja se isso faz algum sentido para você. Não? Então de onde caralhos um homem tira a idéia de que ele tem o DIREITO de estuprar uma mulher, independente da situação? "Ah, ela estava quase pelada..." NÃO. "Ah, ela estava na minha a noite toda, eu sabia que ela queria..." NÃO. " Não, não e não. Sabe o que um não significa? Significa que você é homem o suficiente e honra o que tem no meio das pernas e vai embora dar em cima de outra garota que te queira, afinal mulher é o que não falta nesse planeta. Estuprar alguém porque você acha que ela queria mesmo depois que ela se negou é o mesmo que chegar em casa bêbado e enfiar a cara do seu cachorro na bosta dele achando que é ração enquanto o coitado apenas se debate: ambas querem dizer que você é um idiota. 


Não importa se uma mulher vai uma festa usando uma lingerie ou um vestido Valentino. Não importa se ela está usando o maldito biquíni dourado da princesa Léia, ninguém tem o direito de cometer a violência que o estupro é com qualquer uma delas. Somos todas mulheres que lutamos muito para chegarmos onde estamos, somos seres humanos iguais aos homens que merecemos ser tratadas igualmente. Das mulheres nascem os homens, nascem as outras mulheres, nascem líderes, nascem e devem aprender com suas mães a tratar qualquer um com respeito. Nós amamos, e nos deixamos submeter muitas vezes por esse amor. Nunca ganhamos nada de mão beijada. Votamos pela primeira vez na Nova Zelândia em 1893, em 1918 na Inglaterra, em 1956 em Portugal, em 1945 no Brasil. Somos presidentes, somos chefes de governo, somos rainhas, somos mulheres que têm duas jornadas de trabalho diárias para conseguir criar os filhos sozinha, somos mulheres comandando multinacionais, somos mulheres que foram ao espaço, somos mulheres que lutamos pelo nosso direito de expressão, somos mulheres criando obras literárias que marcaram uma geração inteira. Não somos sexo frágil nenhum. Nós ficamos de pé quando todos os outros caem, seguramos as pontas quando todos os outros pensam que é o fim. E nós podemos decidir sobre nosso corpo, sobre nossas vidas e podemos aceitar nossas escolhas e lidar com elas como qualquer um. 

Provavelmente quem leu esse texto até o fim está convencido de que sou feminista e que certamente todas as minhas idéias são relacionadas à causa. Se é feminismo tudo o que disse, ficarei feliz quando toda mulher puder sair na rua à noite sem medo algum de ser forçada a fazer algo que ela não quer. E tudo começa em casa.

"A woman can preach, a woman can work, a woman can fight, can rule, can conquer, can destroy — just as much as a man can." Zoë Saldaña

domingo, 26 de agosto de 2012

When you ain't got nothing, you got nothing to lose.

Parece fácil seguir a cartilha que te dão desde o momento em que você nasce para segui-la até sua eventual morte. Muitas vezes durante os dias eu me sinto como uma rebelde de um futuro distópico onde todos são obrigados a ser sociais e ter milhares de amigos e dezenas de namorados. Meu Deus, eu não tenho suportado ninguém. Todo mundo é educado desde criança para entender que não ter nada é uma coisa terrível e abominável e que seremos infelizes para todo o sempre se permanecermos em tal estado. Por isso aprendi a sempre questionar o que os outros dizem, por maior verdade universal que uma coisa pareça ser. Não ter nada é libertador. Quando não se tem nada, você pode fazer o que você quiser. Você pode sair no meio da noite sem dar satisfação e só voltar três dias depois, pode ir a qualquer lugar e fingir ser outra pessoa. Não se tem nada a perder. 

Minha teoria é que não ter nada é algo que acompanha determinadas pessoas pelo resto da vida, não importando a quantidade enorme de coisas que elas pareçam ter. Eu não tenho nada, e afasto-me cada vez mais daquilo que pareço ter. Quero repeli-los, quero que vão ser tudo o que nunca poderei ser ou participar longe de minha vista, queria poder ter sido parte da amizade que me sinto cada vez mais distante. Meu Complexo de Deus me isola cada vez mais, como se eu mesma soubesse que no fim de tudo eu acabarei sozinha por escolha própria. Não tenho nada a dizer, nada a oferecer, nada a deixar para as futuras gerações que espero que não sejam como eu. Sou uma bomba relógio prestes a explodir na mão de quem estiver mais perto, e que infelizmente nenhum deles é quem eu gostaria que catasse meus pedaços. Aquela minha idéia de estar apenas acumulando amigos com o passar dos anos foi por água abaixo há muito tempo, enquanto todos me dizem que devo sorrir e socializar mais. 

Eu não tenho paciência pra quase mais ninguém, e meus momentos agradáveis duram menos do que um fósforo aceso. Às vezes eu acho que estou ficando maluca, que nada disso vai levar a nada, que ninguém nem ao menos vai lembrar de mim daqui há quarenta anos. Não confio mais em ninguém, principalmente em mim mesma. Minha mente prepara truques para me enganar e trincar cada vez mais minha sanidade. Nunca pensei que chegaria ao ponto de que a felicidade e amizade alheia fosse me incomodar de tal modo, porém nada é uma surpresa muito grande quando se trata de mim. Um instável eu, um imprevisível eu, com uma imaginação que grita na minha cabeça 24 horas por dia. Pois quando não se tem nada, só te resta imaginar como seria ter tudo.

"I have nothing to offer but blood, toil, tears and sweat." Winston Churchill

domingo, 8 de julho de 2012

Pelos céus azuis

Quando eu era criança, eu tinha a certeza de que eu seria bonita e magra quando tivesse, sei lá, 20 anos. Não que eu seja agora, mas pelo menos eu tinha a certeza de que eu chegaria a essa idade e que minha vida mudaria completamente ou pelo menos alguma coisa. Eu sinto falta de sentir isso. De sentir que eu vou morrer com mais de noventa anos, cercada de netos e bisnetos e que eu terei feito algo com a minha vida. Eu não sei nem se vou chegar aos trinta anos. Pode parecer loucura, mas nos últimos anos eu sempre tive essa sensação de que eu não duraria por aqui muito tempo. Por isso eu sempre estou me torturando sobre desperdiçar tempo, desperdiçar vida. 

Eu sempre quis ser tantas coisas. Escritora, psiquiatra, médica da Cruz Vermelha, palestrante, veterinária, pintora, astronauta, cientista. Eu queria dar às pessoas o melhor que eu tinha, numa tentativa de compensar alguma coisa que eu não sabia se tinha feito ou se ainda, algum dia, faria. Eu queria ser feliz. Mas de verdade, não apenas durante cinco segundos. Alguma coisa que eu pudesse chamar de "melhor época da minha vida", algo a que eu pudesse me apegar quando os pensamentos ruins tornassem as noites ainda mais longas e assustadoras. Mas tudo o que eu consigo absorver e reter no meu lobo temporal são pesadelos e fracassos que voltam para me assombrar na primeira oportunidade que aparece. Eu só queria poder ter sido normal, com uma vida normal. Oh Deus, como eu queria ter sido normal. Que nada tivesse acontecido quando eu tinha oito anos. Que eu fosse estúpida, burra e ignorante. Como eu queria a ignorância. Qualquer coisa que me fizesse capaz de lutar pela vida que possuo, pela vida que quero ter.

Eu nunca culpei ninguém pelas escolhas que fiz até hoje. Acho que a gente tem que ser corajoso o suficiente pra admitir o que fizemos, porque — justamente — nós as fizemos. Mesmo que alguém tenha influenciado, foi você que foi lá e escolheu aquela opção, aquele caminho. Eu fiz minha existência. E, em algumas coisas, eu tento mudar e perseguir, porém não sei como. Eu me acomodo — bem vinda de volta, zona de conforto — e me perco cada vez mais do que sempre sonhei ser. Todas as milhares de coisas que desejei ser. No entanto, encontro certo perdão e entendimento se considerar-se que nada bom sai de momentos bons. Assim como Van Gogh, eu transformo minha dor e vida de merda no que chamo de arte. Ele tinha seus quadros e eu tenho esses textos de merda que quase ninguém lê. 

Não sei o que acontecerá comigo nos próximos 5, 10, 20 anos. Talvez eu continue aqui nessa cidade ou vá morar na Nova Zelândia, talvez eu continue escrevendo aqui ou talvez tenha resolvido publicar meus livros. Talvez tudo, talvez nada. Só espero que meu eu do futuro não me odeie. Eu sinto que ele vai, mas espero que não. Espero que meu eu de só-sabe-deus-quando tenha conseguido a felicidade que não pude obter até agora. Que ele tenha conseguido dançar num quarto, tendo apenas um abajur aceso, com alguém que ama ao som de Chet Baker, que ele tenha feito milhares de tatuagens, que ele nunca mais pense em suicídio. Espero que algum dia eu possa compreender que tudo acontece mesmo por uma razão e que eu consiga me convencer que eu não serei desse jeito para sempre, que alguém vai bater com uma pedra na minha cabeça e eu vou finalmente virar uma pessoa que não vai desistir de mim. Uma vez um professor me chamou depois do fim da aula e me perguntou porque eu era tão calada. Antes que eu pudesse pensar em algo para responder, ele citou Jean-Jacques Rosseau dizendo que "Silêncio absoluto leva à tristeza. É a imagem da morte." Nada respondi e saí. Mas nunca esqueci aquilo. E acho que ele foi uma das poucas pessoas que pôde me ver como eu realmente era. Talvez seja como o cometa Halley e algo assim só aconteça daqui há 76 anos. Mas eu espero. Espero enquanto ainda respirar, como sempre esperei. Só preciso descobrir se meu aguardo não é apenas mais uma daquelas perdas de tempo contra as quais eu sempre lutei.

"Everybody's youth is a dream, a form of chemical madness." F. Scott Fitzgerald 

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Uma estrada áspera conduz às estrelas.

Você está no meio de uma conversa bem franca com algumas pessoas e sempre aparece aquela sensação de como-eu-sou-mais-maduro-agora-do-que-era-um-ano-atrás. Mas na verdade é tudo um monte de bobagem. Sim, é isso mesmo. Você aí, que pensa que é completamente maduro e hábil a tomar decisões e formar opiniões importantes sobre isso ou aquilo, não é maduro coisíssima nenhuma. Você está apenas a cada ano mais perto da morte, e assim mais conformado com o que a vida lhe dá e lhe traz. De qualquer maneira, eu sinto que eu mudei muito nos últimos três ou quatro anos. Eu olho para trás e não consigo assimilar que eu já fui de tal jeito, porquê eu fazia aquelas coisas e não outras, porquê eu deixei algumas pessoas fazerem certas coisas comigo. Não acho que amadurecer seja a palavra correta, mas acho que cresci. Finalmente, cresci. E continuo crescendo, mesmo ainda sendo baixa. E passo a compreender certas coisas, além de aprender. Cada vez mais acredito que é verdade que todas as nossas células são substituídas completamente a cada sete anos, criando pessoas novas e dando mais algumas chances de você deixar de ser um cretino. 

Eu não acredito em destino. Realmente não. No entanto, eu compreendo algumas coisas relacionadas a ele. Como, por exemplo, pessoas que trilham dois caminhos completamente diferentes mantendo a esperança de se encontrarem numa grande falha temporal que os una novamente. O crescimento me faz ver isso não com tristeza, mas com certa sabedoria de que não há porquê fazer tempestade em copo d'água quando tudo pode ser bem azul e bonito enquanto ainda lhe for permitido ser. Uma hora a gente cansa do drama, cansa de tentar novelizar nossa própria vida e tenta ver tudo no preto e branco. É como em Casablanca: não é porque o Rick amava a Ilsa muito antes do marido dela que ele obrigatoriamente largaria tudo para fugir da Guerra com ela. Venho raciocinando há muito tempo como as pessoas entendem errado essa coisa de amor. Não existe egoísmo nesse sentimento. Sempre achei que ele fosse algo tão importante e imensurável que não se descreve apenas com as-três-palavras. E ao contrário do que os filmes nos ensinam, a gente consegue ser feliz mesmo sem quem nós amamos, mesmo que por limitado tempo. Não se morre, não se esquece, porém não se sai ileso. Todas as noites ainda haverá uma cara estúpida em particular para se pensar em ir ao encontro, e isso deverá bastar por hora.

No final, as pessoas que nós vamos nos tornando são uma peneira que filtra que permanece e quem passa em nossas vidas. Não há arrependimento dos momentos que vivi com aquelas pessoas nem procuro esquecer o que elas foram para mim em determinadas épocas, apenas aceito que elas se foram e não voltarão mais. É quase como a morte — com certa dor que se transforma em lembranças que resgatamos quando tentamos saber quem éramos em alguns períodos. A gente cresce achando que vai acumulando amigos com o passar dos anos, mas na verdade ficamos com cada vez menos. Então parabéns aí, amigão que se acha maduro e adulto: isso tudo é uma merda. Sempre achei que quem muito se afirma maduro não passa apenas de alguém que não sabe quem é. E eu sempre soube quem eu era, mesmo quando fingia para mim mesma que não por meio de milhares de verborragias. Requiro a exceção pelo motivo de não ser tão fácil se armar com cota de malha e espada e partir para a batalha quando é seu próprio monstro que você tem que derrotar. Vamos deixar de ser idiotas e tentar sermos as melhores versões de nós mesmos que podemos ser.


"I will remember the kisses  
our lips raw with love  
and how you gave me  
everything you had  
and how I  
offered you what was left of  me"
                                                      (Charles Bukowski)

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Pense duas vezes antes de lembrar.

Gosto dessa sensação de inércia, desse vazio que parece dominar, dessa nostalgia que pensei que estava morta. Momentos em que eu estou com tanto sono que nem percebo que estou ouvindo a mesma música há vinte minutos. Estava lendo um blog de uma amiga de um "conhecido" e fiquei me perguntando porque eu não poderia escrever daquela maneira; daquele jeito bonito esteticamente falando, daquela coisa de tocar lá dentro, de te fazer querer uma vida mais bonita, mais com teus amigos. Então eu percebi que eu não queria ser eu; que eu queria ser você, ele, aquele outro, e aquele outro ali também, qualquer coisa, qualquer pessoa menos ser eu. Alguém a quem permitissem sentir dor, sangrar e sangrar e sangrar até que toda a podridão se esvaísse sem eu me sentisse culpada por isso. Culpada porque eu tenho que segurar as dores do mundo, se aconchega aqui no meu braço e sofre o quanto quiser que continuarei a ser rocha e infinita. Eu sempre fiz tudo meio errado mesmo, nunca deixei de não ter jeito com as coisas, de quebrar relógios e espelhos que valiam quase uma fortuna porque me recusei a acender a luz. Mas que bosta de vida, que bosta de texto, que bosta de tudo. Às vezes eu acho que eu dormi por muito, muito tempo. Tempo demais. Tempo, que às vezes, eu acho que ainda está se passando dentro da minha cabeça e tudo isso — o que vocês chamam de vida — não passa de um sonho. Eu estou dormindo em algum outro lugar aí, sem essa vida fodida e azarada, sem essa vergonha e esse medo e essa culpa, essa maldita culpa. Ah meu deus, essa vontade de gritar comigo mesma, porra pára de ser assim, pára de se culpar por essas coisas pequenas, por essas mentiras, por essa falta de sorte, por apelar para alguém que não pode te ouvir, por ter nascido. Espero que eu acorde logo ou não acorde nunca, esse meio termo me cansa mais do que tudo, mais até do que nunca ter vivido de verdade. Ninguém vai dizer nada ao meu favor por que ninguém nunca me viu, e quem acha que o fez está mais assombrado do que eu. Porque porra, qual é o meu problema? Porque eu me sinto tão superior a todo mundo sendo que eu sou apenas mais uma merda que ocupa um espaço que poderia ser desfrutado por alguém muito melhor. Quando eu era criança, imaginava que minha verdadeira família estava em outro planeta, procurando por mim que caí na Terra por acidente. E lá viveriam um monte de pessoas quebradas como eu, e então eu nunca ficaria sozinha. Que a vida me fizesse medíocre e satisfeita com o que tivesse me tornado, ou que eu conseguisse ser mais filha da puta do que qualquer um que já existiu e estar bem com isso. Sempre soube que eu era muito fraca pra qualquer coisa, até mesmo pra viver. Parece mais fácil me esconder como uma menininha num brilho eterno de uma mente sem lembranças esperando tudo ser apagado do que encarar que eu preciso reagir. Porém também tenho cada vez mais a sensação de que eu não sei como sair desse labirinto, poxa eu tô perdida e não vou pagar de fodona nem bancar a heroína, que se foda. Até meu amigo imaginário me abandonou por que eu me abandonei e ele é parte de mim. E continuando a ler o blog de que falei e sendo tocada do jeito que mencionei só me fez perceber que quase dezenove anos depois eu ainda não tinha entendido que eu não tinha nada em minha vida simplesmente por que eu não merecia, porque eu não estava habilitada a lidar com coisas tão frágeis e bonitas assim. Ponho-me numa lista negra de párias que conhecem sua maldição e tem que lidar com ela por todos os dias sem fim como num castigo de Deus grego. Lembrei da música da Band Of Horses que diz At every occasion I'll be ready for a funeral e por incrível que pareça me identifiquei com ela mais do que meu próprio personagem — de quem eu tiro tudo e todos. Ele é minha deixa para amenizar toda a dor dentro de mim; passando-a para alguém que também só existe dentro da minha cabeça, o que no final não faz nenhum efeito. Às vezes eu acho que estou ficando cada vez mais louca, outras acho que estou cada vez mais sã sobre todos esses milhares e bilhares de anos que já vivi aqui calada, só observando por cima da minha franja que ninguém nunca era interessante para mim — embora que seja muito fácil que eu me condescenda com um personagem de seriado que sempre acaba sozinho. No fim de tudo e desse texto, minha maior fala sempre foi a mentira mais contada do mundo, que a cada vez que é dita por mim trata-se apenas de uma tentativa de perdoar a mim mesma. 

                      "Why do you knock yourself out? Take it easy." David O. Selznick

domingo, 10 de junho de 2012

We accept the love we think we deserve.

Para Patrícia e Delmas.

Eu não sou uma menininha. Nunca fui e nunca serei, e acho que isso é uma falha de fabricação que eu não desejaria que tivesse sido diferente. Sempre odiei dever qualquer coisa a quem quer que seja, e por isso meu círculo de amizades sempre foi mais restrito do que o número de pessoas que já pisaram na lua (12 pessoas caso você não saiba). Eu sempre pensei que com o passar e as mudanças dos anos eu teria mais e mais pessoas em minha vida; assim, só o suficiente para poder dar uma festa em casa e não sentir que até um ermitão convive com mais pessoas do que eu. Não que eu vá dar uma festa em casa. Não que eu vá comemorar alguma coisa. Há mais ou menos dois anos, nessa mesma época, eu conheci meus dois melhores amigos. E eu não escolho qualquer um. Eu consigo enxergar um algo a mais, uma luz a mais na aura como se essas pessoas viessem do universo paralelo. Eu vejo a grandeza, vejo o que eles têm de mais especial. Vejo um brilho eterno em tudo exceto eu. Por isso sempre digo que ser meu amigo é mais VIP do que entrar para a Liga da Justiça. Meus melhores amigos são dois idiotas. Completamente e imensuravelmente. Mas eu não os trocaria por nada neste universo. Eu mataria por eles sem titubear, eu quebraria as pernas de quem lhes quebrasse o coração. Eu não sou carinhosa. Não sou sentimental, não sou carente nem muito menos um livro aberto. Não agradeço, não peço por favor, não peço desculpas. Com certeza sou uma pessoa chata pra caralho de se conviver, o que é outro motivo para que eu não tenha muitos amigos. De qualquer jeito, obrigada. Aos dois. Sempre. Mesmo quando eu não disser. Pois sabem que não direi. Obrigada pelas madrugadas de conversas no msn e no Skype, que me fizeram rir mais do que eu imaginava que alguém conseguiria. Vocês são só dois anos mais novos que eu e muitas vezes parece que nossas idades se invertem, e também há outras em que eu os acho adolescentes demais pra mim. Obrigada por me suportarem nos dias em que minha personalidade cruel e perversa está no comando das minhas ações, obrigada por me quererem sempre por perto. Sei que tô prometendo há muito tempo ir visitá-los. Eu sei. Mas eu vou conseguir. Porque porra, vocês são bebês demais ainda para se despencarem do outro lado do país pra cá. E as mães de vocês ainda pensam que sou uma pedófila. Eu pensei muitas vezes em todas as coisas que faríamos (e faremos) juntos, como acordar a Patrícia de cinco da manhã cantando "Patricia The Stripper" e obrigar o Delmas a assistir O Senhor dos Anéis comigo. Obrigada pelas cartas (as que eu não recebi também, por pura preguiça), pelos SMS, pelos comentários no blog, pela zoação do meu sotaque. Obrigada por ter assistido os três primeiros filmes de Star Wars, por ter lido 1/4 de A Sociedade do Anel, por ter visto uma pastelaria chamada "O Senhor dos Pastéis" e ter me mandado uma mensagem dizendo que lembrou de mim. Obrigada pelas competições, pelas ligações no meio da minha aula na faculdade, pelos "eu te amo" que eu respondo com "obrigada", pelas vezes em que me ouviram falar dos personagens do meu livro. Vejo qualquer merda na rua e tenho vontade de ligar pra falar "Cara, olha a merda que eu vi aqui", mas o interurbano é caro demais. Não tenho culpa se mamãe quis vir morar na puta que pariu. Não sei muito bem até hoje como nós viramos amigos, mas acho que esse tipo de coisa é assim mesmo. A gente vai se envolvendo e envolvendo e quando vê já está recebendo SMS de madrugada da pessoa falando sobre o pau dela. Não me preocupo com o dia em que vocês se afastarem da internet e consequentemente de mim, pois sei que vocês vão continuar lembrando de mim por associação sempre que virem alguém rejeitando batata frita ou falando sobre Doctor Who. E não esqueçam que eu sei onde vocês moram. 

Nicolas Queide para o todo o sempre,
Jaciara Macedo

terça-feira, 1 de maio de 2012

Os meios que sempre levam-me ao meu fim.


Olhou para o teto assim que abriu os olhos e foi a primeira coisa que viu. Que sempre via. Caminhou até o banheiro e viu seu reflexo no espelho, sempre ofuscado pela foto ali posta. Sempre fitava a foto dele quase como se seu corpo físico estivesse ali, encarando-a também. Tantos momentos sem volta, tantas estradas percorridas como se fugisse de algo que deseja seu fim era tudo fruto do encontro deles, da história deles, do sonho deles que nunca foi real. Sua pressa e precisão e perfeccionismo eram traiçoeiras demais para que as coisas não se partissem em mil pedaços, uma hora ou outra. Ela já era quebrada, há muito e muito tempo. E ninguém podia fazer nada a respeito disso. 

Só ele. Só ele tentara, só ele suou e ficou debaixo do sol escaldante e tentou colar tudo com a substância mais potente que existira. Era como escalar uma montanha tendo o conhecimento de que não havia prêmio algo no topo dela, como jogar xadrez sozinho e ter a certeza de que sempre irá perder e ganhar ao mesmo tempo. Ela dera tudo o que lhe pertencia, para que nada morresse com ela quando finalmente se deixasse descansar em paz. Por muito tempo ele pensou que era ele que tinha sido salvo pela moça, todavia foram seus braços que foram mais rápidos que os do anjo negro que pairava o tempo todo sobre ela. Ela lhe devia tudo e não ousaria profanar tal pensamento. Há quem diga que não há muitas segundas chances por aí, principalmente quando se trapaceia com quem detém o poder. Sua conta estava mais alta do que poderia pagar.

Nunca disse os preços que ardilosamente pagou e provavelmente nunca dirá. Por que não importa, nunca importou. Ela era sempre destruída pelos seus próprios sentimentos como se no momento seguinte ao sentir algo forte demais, tudo se destruísse em alguns poucos segundos. Cuspia sangue enquanto tentava a todo custo afogar seus pensamentos, não dando a mínima sobre o quão demoníaco isso a tornava. E assim como cada noite tem seu fim ao chegar da manhã, bastava andar para fora do banheiro para que tal nome e tal foto com tal imagem ficasse manchada em sua mente. Era um eterno ciclo de auto destruição, que culminava num completo queimar e logo depois num renascer que não tinha nada de novo. A mesma dor, os mesmos sacrifícios, os mesmos pesares. Ele ainda estava lá, esperando por ela mesmo sem saber que fazia isso. Apenas pessoas que viram a oportunidade de se salvar e a agarraram como se não houvesse amanhã. E ela sempre estaria lá para garantir que ele o tivesse.

domingo, 8 de abril de 2012

Do porquê não te amo.

"(...) Porque não te amo, tenho este corpo para te oferecer; porque te amo fujo e desapareço. E, porque desapareço, não te esqueço, porque essa é a minha forma de te amar - tudo o resto é ainda mais e mais sofrimento."
Não Te Deixarei Morrer, David Crockett - Miguel Sousa Tavares 


Meu peito trabalha na lavoura e carrega o peso mais pesado de todos sempre. Ele se alimenta de uns poucos momentos em que não dói, em que tudo é bem branquinho e claro e que não precisa de explicação. Gostaria que você pudesse olhar dentro de mim com um periscópio e ver se descobre territórios inexplorados onde você ainda não tocou, onde você não viu em carne viva. Vou ali desaparecer e fugir pra ver se numa dessas evasões eu te encontro na tua fuga, que é onde eu finalmente posso te ver novamente, todo coberto com esse  silêncio partilhado que é enorme e impermeável, apesar de não ter um pingo de estranheza ou incômodo. Mas também não vou te dizer que me importo o suficiente pra te amar, por que não te amo. Os anos vão passar e eu vou continuar não te amando e te guardarei numa caixa bem escondida no meu armário e por mais gato selvagem que você seja, vai acabar se acostumando com a clausura. Num desses dias aí quando o tempo parar por alguns poucos minutos e você lembrar de mim e aquela música de Casablanca que você acha chata tocar na sua cabeça, vou estar à espreita pra te assombrar porque nunca tive coragem o suficiente pra usar meus olhos pra ver teus olhos. Quando ligar a TV poderá me ver em rede nacional dizendo a todo mundo que eu não te amo, e quando ligar o rádio ou o computador ou o celular eu vou estar nesses objetos também repetindo e repetindo o quanto eu não te amo. E então você vai acreditar e enfim poderei descansar em paz, sem o peso do teu desapontamento sobre mim. E então você poderá viver em paz, sem o peso do meu fantasma sobre você. A vida, o universo e tudo mais não se movimenta muito agradavelmente ao meu redor, mas tudo mantém seu equilíbrio intenso e diário que apesar de tudo me dói menos do que a ausência do que nunca esteve presente. Meu corpo não cumpre as Leis da Robótica quando não obedece minhas ordens de não virar gelatina ao menor sinal de um impacto iminente com o que deveria permanecer enterrado onde deixei, embora que não me seja mais estranha nenhum descontentamento desde a de continuar viva. Eu não te amo por que eu precisaria de um coração para tal coisa, e você já o tomou de mim há tanto tempo que nem consigo mais lembrar quando. Você agora é um Time Lord e eu sou o Homem de Lata, personagens de histórias que nunca se encontrarão. Pois pelo menos em nos perder do caminho um do outro sempre fomos bons.

Música do post: 9 Crimes - Damien Rice

sábado, 31 de março de 2012

Mrs. Nobody.


Todas as minhas palavras são de mentira. Eu não sou nada disso, nenhuma dessas coisas que um dia ousei vomitar. Eu não sou mais eu e todo mundo continua sendo todo mundo, todo mundo rindo alto, todo mundo seguindo com suas vidas, todo mundo que não tem mais tempo para mim. Sempre ouvi dizer que quando o corpo chega ao nível máximo de dor que ele consegue suportar, ele mesmo produz sua própria anestesia. Se isso não é o limite, até onde terei que descer para que eu consiga passar apenas um dia neste planeta sem odiar o que tenho sido e o que fui. Os demônios em minha mente gritam alto demais para que eu consiga ouvir a voz de alguém falando sobre suas frivolidades e prioridades. Não vou dizer que desisti de mim por que ainda há coisas que me importam nessa vida, no entanto está tão difícil. Nesse furacão de oscilações que me tornei todos os que amo são atingidos por destroços de tudo o que um dia sonhei em ser ou fui sem saber que era. Lembra quando eu te disse que o barco estava furado e você começou a rir dizendo que minha metáfora não tinha sentido algum? Mais do que uma tentativa de parecer inteligente, aquilo era um pedido de socorro. Um SOS, um sinal de fumaça indicando que algo estava errado e que só precisava que me ajudasse. Mas você não viu nem entendeu. Nem ninguém. Cansada de pedir piedade, peço a Deus que me faça viver o suficiente para ver o Universo. Ele comporta a mim e a minha dor sem fazer pergunta alguma. E só por causa dele continuo criando, continuo cumprindo minhas responsabilidades. E aceitando as coisas que não tem mais remédio. E sendo de mentira, como sempre. Por que tudo o que era bonito se foi e agora só tem eu e essa vida que não comando mais. Cansada de se sentir cansada, triste de sentir tanta tristeza, dolorida de sentir tanta dor. Mas não te preocupas porque me deixo em casa sempre que sair e levo minha Consciência Nestene no meu lugar para que ninguém tenha que se sentir incomodado ou sujo com minha podridão e com meus pedaços soltos. Tudo vai embora em algum momento e nada disso foi planejado, eu não tenho culpa. Seja como for, eu continuo cumprindo minhas promessas. Continuo sentada aqui esperando tudo passar e eu me sentir um gênio novamente, como se tudo na vida se resolvesse num passe de mágica. Sou o Rei Midas que quis muito e acabou ficando sozinho pedindo misericórdia a um falso Deus, que numa tentativa desesperada de mostrar existência, cegou a todos e me fez rainha das dores do mundo.

Música do post: Black Star - Radiohead

domingo, 18 de março de 2012

1011.

Doutor, você fez esse "banner"? Achei bem feito hein, se desistir da medicina já pode ser publicitário (continue na medicina pfvr)

Meu pai diz que desde que eu saí da barriga da minha mãe eu sou a pessoa mais chata do universo. Não tenho paciência pra muita coisa, mas faz tanto tempo que não faço um meme que decidi responder o que o Doutor (mais conhecido como Fernando para os outros) me mandou. Sem delongas, vamos lá.

11 coisas aleatórias sobre mim: 


Me entedio com muita facilidade.
Não gosto das outras pessoas.
Meu QI é 160.
Curso Jornalismo na UFRN.
Sou viciada em séries, filmes e HQs.
Quero publicar meus livros.
Desejo viajar pelo mundo inteiro.
Fui bully na escola.
Tenho um planisfério na parede do quarto.
Meus melhores amigos moram do outro lado do país.
Minto muito.

11 perguntas feitas por Fernando.


1. O que você faria se seu filho/a fosse homossexual?
Falaria "beleza então" quando ele me contasse e continuaria tudo normal. Contanto que ele fosse feliz, não me importaria com quem ele ou ela se relacionaria. Além do mais, tenho mais o que fazer né.

2. Qual é sua matéria preferida na escola?
Minha matéria favorita quando eu estava na escola era História. Ainda gosto muito, mesmo estando na faculdade. Gosto de visitar tempos passados, o que me incentiva mais a construir minha máquina do tempo.

3. Você se preocupa com o planeta?
Não.

4. Qual sua atividade mais rotineira?
Ultimamente, tem sido ler HQ.

5. O que você pensa sobre seus pais?
Sou obrigada por protocolos sociais a amá-los, né?

6. Já comprou algo de que se arrependeu?
Um livro, chamado "Para Sempre". Dinheiro jogado no lixo por um livro tão merda.

7. Maior Arrependimento?
Não ter nascido antes e conhecido Sir Tolkien.

8. Maior conquista?
Vou responder com "passar no vestibular" porque foi a única coisa que presta que já me aconteceu. Mas poderia acrescentar ter feito o Delmas aprender inglês.

9. Se o mundo fosse acabar hoje você preferiria executar uma última maldade ou bondade?
Eliminaria gente que me incomoda só pelo fato de ainda estar respirando.

10. Qual foi a pergunta mais idiota que te fizeram? (Depois dessa)
"Mas Gandalf é o rei? É ele quem volta?" (foram duas mas fuck the police)

11. Se ganhasse 20 milhões na loteira, o que faria primeiro?
Conheceria meus melhores amigos, compraria ações do LHC e construiria minha escola para super dotados na Escócia. E me envolveria em causas humanitárias depois de terminar meu doutorado numa universidade britânica.

terça-feira, 13 de março de 2012

Alone on the water.

“When you're drowning, you don't say 'I would be incredibly pleased if someone would have the foresight to notice me drowning and come and help me,' you just scream.”
John Lennon


Certa vez eu disse ao meu psicólogo que eu era uma psicopata que não sabia bem como meu distúrbio mental funcionava. Em vez de machucar qualquer outro vivente que perambulasse pelos mesmos caminhos que eu ou que cruzasse minha estrada, eu enfio a faca sem dó nem piedade bem no meio do meu peito. A dor vai aparecendo aos poucos como quem se esconde de algo inevitável e no fim vê que foi inútil remar na direção contrária à do rio. É fácil dizer para ouvidos alheios que você deve aceitar o que você nasceu sendo, quando tudo o que você vê e ouve ao fechar os olhos é escuridão e o ruído dos seus próprios pensamentos sem fim. Parece não haver frequência no mundo que interrompa esse barulho constante que muitas vezes não me permite dormir. Não tenho sido nada para o mundo e o mundo não tem sido nada para mim, nada além do grande paradoxo que me tornei. E todo esse vazio dá desespero. Porque no vazio não há nem uma sequer respiração, não há medo, não há futuro. No vazio você consegue ver seu demônio, no vazio você consegue ver sua própria monstruosidade. E no vazio faz doer quando você não consegue enxergar seu reflexo por não ser nada. A única solução é me esconder covardemente nas entrelinhas, esperando que alguém, algum dia, em algum século ou milênio ou galáxia saiba interpretar o que minha mente caleidoscópica quis dizer. Mas minhas melhores palavras, meus melhores textos, minhas melhores citações ninguém pode ver. Eles moram dentro de mim e eu sou oceano perigoso de se navegar, repleto de krakens e serpentes marinhas gigantescas. Ninguém pode ver por que são elas que me machucam, são elas que me rasgam dos dedos pequenos do pé até meu último neurônio. Meu masoquismo não me permite abandoná-las ao léu, pois como Scarlett O'hara eu prometi, com Deus como minha testemunha, que jamais deixara as palavras me escaparem novamente. Minha psicopatia reversa junto com minha imaginação desenfreada as alimenta com carinho, as acalenta e as nutre com tudo o que elas precisam, fazendo com que assim elas estejam sempre prontas para a minha guerra diária e assim como Hitler, eu prefiro desencarnar do que perdê-la. O que torna minha vida uma eterna Lei de Godwin.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Many-worlds interpretation.


Assim como uma aurora boreal, você iluminou o céu sob minha cabeça. E você ficou lá, brilhando enquanto o resto das estrelas e das nuvens e da lua caía sobre mim, mas eu nem notava. Pois eu te via lá, como sempre vi. No fim, sempre é você. Todas as pessoas passam, todos caminhos chegam a um determinado destino, no entanto em todos eu te vejo. É como se você estivesse em todos os mundos de Hugh Everett III, em todos os universos, em todas as músicas que tocam no barzinho, em todos os contextos de todas as conversas de todas as pessoas do mundo. Eu nunca digo obrigada, nunca digo tchau, nunca digo que estou errada. E você continua lá, imprensado entre meu amor pela física quântica e por viagens espaciais tentando me convencer de que é mais inteligente do que eu. Ninguém que eu vejo conhece o que o amor é, só nós. Só nós que pomos o companheirismo acima de tudo, só nós que lembramos um do outro com coisas estúpidas e banais. Todo mundo passa por épocas de escuridão enquanto tenta descobrir quem é de verdade. E assim como todo o amor do mundo que vive dentro de mim, ela também não me desabitou. Minha escuridão mantém minha imortalidade quântica sempre ativa, sempre em ascensão, sempre criativa. Tudo em mim continua muito violento, porém tem passado por alguns bons momentos de paz. E é neles que te sinto mil vezes mais perto, mil iguais a você todos juntos na beira da minha cama. Nada de mim te escapa, sei que sou tua prova final. Você me analisa em cada fio de cabelo que sempre diz que é muito liso, você me tem em todas as vezes que consegue ver meu coração batendo e batendo e batendo. Aqui estou eu desistindo de metade de meu corpo para que você tenha lugar para se acomodar quando chegar, para que ache a hospedagem espetacular e não deseje se mudar nunca mais. Minha mão cabe em metade da sua mão, meu pé não chega a ser metade do teu. A gente vive nesse furacão que te proponho que te deixo ser quem me acalma, quem me convence. Vou mentir pro mundo inteiro como sempre fiz e depois vou te amar. Só a gente sabe que é verdade, e só a gente precisa saber disso. Daqui a 50 anos vamos ser velhos e viver perto das estrelas, pois elas são história e você é minha história. E por que eu sou muito cafona também.

terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Child of Galileo.

"A noite acendeu as estrelas porque tinha medo da própria escuridão."
Mário Quintana


Os cientistas dizem que se você puder arranjar um jeito de viajar mais rápido do que a luz, poderá ir para qualquer lugar do universo que desejar em questão de segundos. O universo inteiro, que sempre tem algo novo a mostrar já que está em constante expansão. Eu sempre amei as estrelas por não ter medo do escuro, ou talvez por elas serem as únicas luzes que eu via na escuridão dentro de mim. Minhas palavras geralmente não se fazem entender a quase todos, mas me satisfazem quanto a diminuir o grande ruído que o silêncio alheio do mundo deixa em minha mente. É tão difícil estar constantemente insatisfeita com um monte de coisas que optei por não dividir nada mais a meu respeito com qualquer um. Eu não me importo comigo tanto quanto deveria, ou tanto quanto me importo com o bem estar dos que gosto. Talvez por que alguns vêm para este mundo com o objetivo de cuidar de pessoas, e outros vêm para serem receptores desse cuidado. Algumas coisas às vezes me parecem tão fora de foco quanto um óculos sujo que precisa ser limpo para devolver novamente a visão perfeita. Passado, presente e futuro se embaralham na minha cabeça num ritmo frenético como uma constante explosão estelar fazendo um barulho insuportável, embora que para os outros eu esteja em completo silêncio. Einstein dizia que imaginação era mais importante do que conhecimento, no entanto eu acho que bem no fundo ele sabia que se você tiver conhecimento e imaginação, você pode mudar o mundo. Ou talvez só o mundo de algumas pessoas. Eu sonho sobre galáxias, supernovas, nebulosas e milhões de outras coisas que não estão ao meu alcance e talvez jamais estejam, mas tudo bem. Pelo menos estou viva. Pelo menos eu posso criar, pelo menos posso imaginar. Pelo menos minha mente não fica estagnada. Pelo menos eu ainda consigo amar, mesmo do meu jeito estranho. E é só uma questão de tempo e de sorte para que as Moiras que tecem minha existência resolvam colocá-la no caminho certo. Dançarei sozinha entre as estrelas enquanto a minha música ainda tocar, esperando que algum dia minha mente permaneça no mesmo silêncio do que o resto do universo.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

The death and the rise of my best friend.


Há um ditado alemão que diz: "Mudar e melhorar são duas coisas diferentes." Muito provavelmente não seja completamente perceptível, principalmente para quem muda, tal alteração. Eu tinha um melhor amigo, não há muito tempo, que era uma das pessoas mais importantes da minha vida. Ele foi minha única família, meu único porto seguro, meu único lar quando todo o resto do mundo parecia fechar os olhos para mim igual aos macacos que não vêem, não ouvem e não falam. Ele pareceu escapar da minha mão tão maleavelmente quanto gelatina, e eu apenas o vi escorrer e se tornar alguém que não conheço, que não reconheço. A vida vai passando na sua frente e transformando as pessoas nas coisas que elas mais detestavam nos outros, sem que você possa fazer nada para evitar. E talvez porque eu sinta uma falta desesperadora dele, isso tem uma proporção maior para mim do que qualquer outra coisa. Meu melhor amigo era a melhor e mais inteligente pessoa que eu conhecera no mundo inteiro. Ele, assim como eu, estava à frente do seu tempo, o que foi um dos motivos pelos quais eu achava que nosso encontro já fora premeditado e escrito nas linhas do tempo bem antes de nossos nascimentos. E apesar de me sentir mais egoísta do que já sou naturalmente, eu queria poder ver o amigo que tanto amei outra vez, algum dia. Por que eu sei que ele ainda está lá dentro dele, e aparece de vez em quando mesmo sem que ele perceba. E é ele, o outro ele com quem eu dividi um dos melhores tempos da minha vida, que eu queria ter de volta. O outro ele que nunca me magoaria dizendo coisas que o atual ele reproduz. O outro ele pra quem eu contei coisas da minha vida que eu nunca tinha contado pra ninguém, sem esperar nada em troca a não ser lealdade. O outro ele com quem eu conseguia ter uma conversa normal sobre qualquer coisa sem que esse atual ele fizesse uma piada idiota a cada trinta segundos. Na maior parte do tempo eu vejo as coisas como temporárias e com prazo de validade definidos, mas nunca imaginei que pudesse imaginar isso na nossa amizade. Na minha imaginação sem limites seríamos amigos até ficarmos velhos brigando até mesmo pela posição de um porta retrato, mas eu não sei se consigo lidar com essa nova pessoa que ele se tornou. Esse novo ele está expulsando de mim todo o amor e carinho que eu sempre senti pelo meu velho melhor amigo, e eu não sinto a mínima vontade de lutar contra. Ainda há algo dentro de mim que me diz que isso não é uma causa perdida, que não é em vão, que assim como as águas de um rio, tudo segue o seu curso, tudo muda. A última pergunta a se fazer é não estou lamentando sobre a alma de alguém que não vai mais voltar, de lembranças que nunca serão as mesmas, de momentos que eu nunca mais terei. 

Música do post: Uno - Muse

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Last blues in Paris.


Depois de muitos anos perdidos e encontrados, depois de muitos sacrifícios e poucos ganhos que a vida lhe proporcionara – ou deixou de proporcionar – o momento que a conduzia ao começo ou ao fim de sua vida finalmente havia chegado. Seus dedos deslizavam sobre a borda de seu copo quase sem mais uísque enquanto seus olhos fechados mantinham sua mente deliciando a agradável voz que cantava no palco à sua frente quando uma mão pousou sobre seu ombro.

– Srta. Juno? – disse o maître. – Perdão, mas seu acompanhante acaba de chegar.
– Creio que ela não necessita adivinhar quem sou, não é mesmo? – disse o homem, surgindo atrás do gentil funcionário.
– Obrigada, George – agradeceu Juno ao bom empregado do restaurante.
– Por que você quis me encontrar neste restaurante tão velho e nostálgico? – reclamou o homem. – Você sabe que detesto esse tipo de lugar. Está me escutando?
– Sim  –  falou Juno, escapando de mais um devaneio. 
– Garçom – estendeu ele a mão, para ser servido. – Mais um uísque puro para a senhorita e um uísque duplo para mim. O mais rápido possível. Juno – prosseguiu, voltando seu foco para a moça. – Eu não tenho muito tempo. O que você quer?
– Você quer dançar? – perguntou ela.
– Não. Diga logo o que quer, e não esqueça que amanhã temos que ir à festa dos meus pais. E que vestido é esse que está usando? Verde? Você nem ao menos gosta da cor verde. Posso considerá-lo no mínimo impróprio.
– Há quanto tempo estamos juntos?
– Desde que éramos adolescentes, obviamente. Você sabe disto, Juno.
– Estão cantando The Doors. Vamos dançar, você adora Jim Morrison.
– Juno.
– Eu amei você durante toda a minha vida, e tenho certeza de que vou amar até meu último suspiro. E é por isso que comprei uma passagem para fora de Paris, com data para amanhã. 
– O quê você quer dizer? – o moço parecia demasiadamente confuso.
– Eu estou dizendo adeus, querido. 

Seguindo o término da música do cantor sessentista, a conversa dos dois entraram num profundo estado de silêncio mútuo. O homem tomou o resto de uísque que havia em seu copo e deu um breve e desacreditado riso. 

– Eu fui tão mal assim?
– Você foi você. – disse ela. – E eu não ousaria pedir que você fosse diferente. Eu não posso fazer isso, nunca pude. Só você. Você que deixou de ser o menino que me amava e virou alguém que não conheço mais. Não posso passar o resto da minha vida esperando que você cresça. Eu te amo, mas não suporto quem você se tornou. Pessoas mudam, apenas isso.      
– Não seja tola – disse ele, deslizando seus dedos pelo pulso dela até a palma de sua mão. – Não vou desistir de você, Juno.
–  Sei que não vai. E sei também que isso não será o fim de mundo para você. Pra nenhum de nós. É só um caminho alternativo. 
– Reconheço este lugar – disse ele, como se fosse atingido por uma lembrança extremamente vívida. – Nosso baile de formatura do colegial foi aqui, não foi?
– Sim  –  sorriu Juno. – Por isso quis vir aqui. A primeira vez que dançamos juntos foi neste salão.

Assim como o destino lhe unira muitos anos atrás, agora os separaria. Os últimos passos dados naquele chão seriam a única prova e marca que vossa junção deixaria no mundo, além de todas as lembranças guardadas dentro deles mesmos. Talvez se vissem daqui há alguns anos, ambos casados com pessoas avulsas e talvez não se vissem nunca mais. Um campo inteiro de possibilidades e de coisas impossíveis que não passavam de mera rotina para eles. 

– Dança comigo? – perguntou ele.
– Sempre.

Uma suave voz feminina começou a cantar e todos os outros corpos no salão pareceram desaparecer. Remember me, don't ever forget me child... We all are only here...

– Eu fiz você feliz?
– Sempre, querido. 
– Há algo mais?
– Há tanta coisa que eu queria dizer, tanta coisa... Mas não importa. Não mais. 

Yes, I did know you were tired and you want to be free... I need someone to stand just right by me...

– Não se vá, Juno. Faço qualquer coisa.
– Você precisa tanto deste afastamento quanto eu. Tudo ficará bem, querido. Tudo ficará bem. Você e eu, sempre ficaremos bem.

Juno entrelaçou seus braços no pescoço dele e sentiu pela última vez o cheiro que sempre foi o seu favorito. Odiava tanto a partida, precisava tanto da partida. Eles eram almas perdidas que se encontraram com a missão de salvar um ao outro, e assim fizeram. Um mais do que o outro, talvez, mas com igual importância. I need your love, I need you to walk all day and all night... Remember me, don't ever forget me child...

– Obrigado, por tudo. –  disse ele.
– Sempre vou lembrar de você ao ver Lynx no céu.
– Está na hora.
– Eu sei.
– Eu vou te amar para sempre.
– Eu sei.
– Tchau, Juno.
– Diga adeus. 
– Adeus.
– Lembre-se de mim, querido. Lembre-se de mim.
– Você e eu somos para sempre, Juno. 

Por que ambos sabiam que haveria uma dança a mais esperando por eles em algum lugar do tempo e espaço, mais uma vez, só mais uma vez até o infinito. 

Música do (e que é citada no) post: Remember Me - Cat Power

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Pink ego box

"O seu único dom era conhecer as criaturas quase por instinto."
Virginia Woolf


Um dos meus maiores defeitos sempre foi achar que a maioria das pessoas ao meu redor e as que observo são nada mais do que um bando de idiotas que não conseguem enxergar fora da caixa. Por isso eu considero especiais todas as pessoas que conseguem me surpreender em algum aspecto. Por que de alguma forma, elas me tocam e eu as toco também. Uma troca justa entre absorver conhecimento e histórias de vida e tempo meu doado. Mas tem dias em que eu acordo detestando tanto o mundo, tanto as pessoas que nele vivem que acho que a única pessoa que pode me satisfazer pessoalmente e intelectualmente sou eu mesma. Tenho mania de sempre achar defeito nos outros, nas coisas, no que me tornei. E tudo o que eu sempre quis foi ser normal. Tudo seria tão mais fácil se eu fosse como as pessoas ao meu redor e não me sentisse tão uma estranha no ninho. Mas quem quer ser normal quando pode ser brilhante? Quem quer ser menos quando pode ser mais, muito mais? O que faz com que eu me sinta cada vez mais sozinha. Sozinha por que parece que rodo sempre em círculos quando a questão é pessoas as quais faço de tudo para não magoar, mas que não se importam em fazer o mesmo comigo. Por que eu tenho que ter tantas expectativas sobres os outros e sobre mim mesma? Porque tudo não pode ser simplesmente leve e natural? Por que as pessoas não podem parar de ser tão estúpidas? Respostas que temo nunca obter. Sempre parece que vago entre o entendimento completo de mim mesma e uma perfeita imensidão de desconhecimento e falta de essência, um enigma eterno que se formou em mim e que não consigo decifrar. O mundo, os lugares e até mesmo eu mudei. No entanto, as pessoas que conheço parecem estar cada vez mais mesquinhas do que nunca. Minha sorte não sai nunca do ponteiro zero e minhas oportunidades continuam num baú afundado no meio do Atlântico. Eu sinto como se estivesse morta a maior parte do tempo, querendo seguir em frente, mas continuando presa ao passado. Não posso tocá-lo, não posso sentir seu cheiro, não posso segurar sua mão quando estiver com medo. Isso não é viver. É ser fantasma de alguém que nunca lhe pertenceu, uma lápide velha e encoberta por arbustos que ninguém mais visita. Minha vida é um quarto entupido de quases em meio a lembranças que nunca aconteceram, camuflado com uma paciência que nunca tive e risos que não parecem meus. Olhar não é ver, assim como gostar não é amar. E é por isso que eu os vejo, é por isso que continuo amando-os. Eu amo vossos temperamentos malucos, vossos egos, vossos dias ruins. Eu amo você e sua incapacidade de ver o mundo além do seu umbigo. Algo me diz que mudanças estão por vir, assim como outras milhares de notícias baratas sobre fins de mundos. Digo-te que posso ver muito além do horizonte se você também conseguir enxergar por cima dos anos e do que considera impossível. Seja o número um.