quarta-feira, 13 de junho de 2012

Pense duas vezes antes de lembrar.

Gosto dessa sensação de inércia, desse vazio que parece dominar, dessa nostalgia que pensei que estava morta. Momentos em que eu estou com tanto sono que nem percebo que estou ouvindo a mesma música há vinte minutos. Estava lendo um blog de uma amiga de um "conhecido" e fiquei me perguntando porque eu não poderia escrever daquela maneira; daquele jeito bonito esteticamente falando, daquela coisa de tocar lá dentro, de te fazer querer uma vida mais bonita, mais com teus amigos. Então eu percebi que eu não queria ser eu; que eu queria ser você, ele, aquele outro, e aquele outro ali também, qualquer coisa, qualquer pessoa menos ser eu. Alguém a quem permitissem sentir dor, sangrar e sangrar e sangrar até que toda a podridão se esvaísse sem eu me sentisse culpada por isso. Culpada porque eu tenho que segurar as dores do mundo, se aconchega aqui no meu braço e sofre o quanto quiser que continuarei a ser rocha e infinita. Eu sempre fiz tudo meio errado mesmo, nunca deixei de não ter jeito com as coisas, de quebrar relógios e espelhos que valiam quase uma fortuna porque me recusei a acender a luz. Mas que bosta de vida, que bosta de texto, que bosta de tudo. Às vezes eu acho que eu dormi por muito, muito tempo. Tempo demais. Tempo, que às vezes, eu acho que ainda está se passando dentro da minha cabeça e tudo isso — o que vocês chamam de vida — não passa de um sonho. Eu estou dormindo em algum outro lugar aí, sem essa vida fodida e azarada, sem essa vergonha e esse medo e essa culpa, essa maldita culpa. Ah meu deus, essa vontade de gritar comigo mesma, porra pára de ser assim, pára de se culpar por essas coisas pequenas, por essas mentiras, por essa falta de sorte, por apelar para alguém que não pode te ouvir, por ter nascido. Espero que eu acorde logo ou não acorde nunca, esse meio termo me cansa mais do que tudo, mais até do que nunca ter vivido de verdade. Ninguém vai dizer nada ao meu favor por que ninguém nunca me viu, e quem acha que o fez está mais assombrado do que eu. Porque porra, qual é o meu problema? Porque eu me sinto tão superior a todo mundo sendo que eu sou apenas mais uma merda que ocupa um espaço que poderia ser desfrutado por alguém muito melhor. Quando eu era criança, imaginava que minha verdadeira família estava em outro planeta, procurando por mim que caí na Terra por acidente. E lá viveriam um monte de pessoas quebradas como eu, e então eu nunca ficaria sozinha. Que a vida me fizesse medíocre e satisfeita com o que tivesse me tornado, ou que eu conseguisse ser mais filha da puta do que qualquer um que já existiu e estar bem com isso. Sempre soube que eu era muito fraca pra qualquer coisa, até mesmo pra viver. Parece mais fácil me esconder como uma menininha num brilho eterno de uma mente sem lembranças esperando tudo ser apagado do que encarar que eu preciso reagir. Porém também tenho cada vez mais a sensação de que eu não sei como sair desse labirinto, poxa eu tô perdida e não vou pagar de fodona nem bancar a heroína, que se foda. Até meu amigo imaginário me abandonou por que eu me abandonei e ele é parte de mim. E continuando a ler o blog de que falei e sendo tocada do jeito que mencionei só me fez perceber que quase dezenove anos depois eu ainda não tinha entendido que eu não tinha nada em minha vida simplesmente por que eu não merecia, porque eu não estava habilitada a lidar com coisas tão frágeis e bonitas assim. Ponho-me numa lista negra de párias que conhecem sua maldição e tem que lidar com ela por todos os dias sem fim como num castigo de Deus grego. Lembrei da música da Band Of Horses que diz At every occasion I'll be ready for a funeral e por incrível que pareça me identifiquei com ela mais do que meu próprio personagem — de quem eu tiro tudo e todos. Ele é minha deixa para amenizar toda a dor dentro de mim; passando-a para alguém que também só existe dentro da minha cabeça, o que no final não faz nenhum efeito. Às vezes eu acho que estou ficando cada vez mais louca, outras acho que estou cada vez mais sã sobre todos esses milhares e bilhares de anos que já vivi aqui calada, só observando por cima da minha franja que ninguém nunca era interessante para mim — embora que seja muito fácil que eu me condescenda com um personagem de seriado que sempre acaba sozinho. No fim de tudo e desse texto, minha maior fala sempre foi a mentira mais contada do mundo, que a cada vez que é dita por mim trata-se apenas de uma tentativa de perdoar a mim mesma. 

                      "Why do you knock yourself out? Take it easy." David O. Selznick

domingo, 10 de junho de 2012

We accept the love we think we deserve.

Para Patrícia e Delmas.

Eu não sou uma menininha. Nunca fui e nunca serei, e acho que isso é uma falha de fabricação que eu não desejaria que tivesse sido diferente. Sempre odiei dever qualquer coisa a quem quer que seja, e por isso meu círculo de amizades sempre foi mais restrito do que o número de pessoas que já pisaram na lua (12 pessoas caso você não saiba). Eu sempre pensei que com o passar e as mudanças dos anos eu teria mais e mais pessoas em minha vida; assim, só o suficiente para poder dar uma festa em casa e não sentir que até um ermitão convive com mais pessoas do que eu. Não que eu vá dar uma festa em casa. Não que eu vá comemorar alguma coisa. Há mais ou menos dois anos, nessa mesma época, eu conheci meus dois melhores amigos. E eu não escolho qualquer um. Eu consigo enxergar um algo a mais, uma luz a mais na aura como se essas pessoas viessem do universo paralelo. Eu vejo a grandeza, vejo o que eles têm de mais especial. Vejo um brilho eterno em tudo exceto eu. Por isso sempre digo que ser meu amigo é mais VIP do que entrar para a Liga da Justiça. Meus melhores amigos são dois idiotas. Completamente e imensuravelmente. Mas eu não os trocaria por nada neste universo. Eu mataria por eles sem titubear, eu quebraria as pernas de quem lhes quebrasse o coração. Eu não sou carinhosa. Não sou sentimental, não sou carente nem muito menos um livro aberto. Não agradeço, não peço por favor, não peço desculpas. Com certeza sou uma pessoa chata pra caralho de se conviver, o que é outro motivo para que eu não tenha muitos amigos. De qualquer jeito, obrigada. Aos dois. Sempre. Mesmo quando eu não disser. Pois sabem que não direi. Obrigada pelas madrugadas de conversas no msn e no Skype, que me fizeram rir mais do que eu imaginava que alguém conseguiria. Vocês são só dois anos mais novos que eu e muitas vezes parece que nossas idades se invertem, e também há outras em que eu os acho adolescentes demais pra mim. Obrigada por me suportarem nos dias em que minha personalidade cruel e perversa está no comando das minhas ações, obrigada por me quererem sempre por perto. Sei que tô prometendo há muito tempo ir visitá-los. Eu sei. Mas eu vou conseguir. Porque porra, vocês são bebês demais ainda para se despencarem do outro lado do país pra cá. E as mães de vocês ainda pensam que sou uma pedófila. Eu pensei muitas vezes em todas as coisas que faríamos (e faremos) juntos, como acordar a Patrícia de cinco da manhã cantando "Patricia The Stripper" e obrigar o Delmas a assistir O Senhor dos Anéis comigo. Obrigada pelas cartas (as que eu não recebi também, por pura preguiça), pelos SMS, pelos comentários no blog, pela zoação do meu sotaque. Obrigada por ter assistido os três primeiros filmes de Star Wars, por ter lido 1/4 de A Sociedade do Anel, por ter visto uma pastelaria chamada "O Senhor dos Pastéis" e ter me mandado uma mensagem dizendo que lembrou de mim. Obrigada pelas competições, pelas ligações no meio da minha aula na faculdade, pelos "eu te amo" que eu respondo com "obrigada", pelas vezes em que me ouviram falar dos personagens do meu livro. Vejo qualquer merda na rua e tenho vontade de ligar pra falar "Cara, olha a merda que eu vi aqui", mas o interurbano é caro demais. Não tenho culpa se mamãe quis vir morar na puta que pariu. Não sei muito bem até hoje como nós viramos amigos, mas acho que esse tipo de coisa é assim mesmo. A gente vai se envolvendo e envolvendo e quando vê já está recebendo SMS de madrugada da pessoa falando sobre o pau dela. Não me preocupo com o dia em que vocês se afastarem da internet e consequentemente de mim, pois sei que vocês vão continuar lembrando de mim por associação sempre que virem alguém rejeitando batata frita ou falando sobre Doctor Who. E não esqueçam que eu sei onde vocês moram. 

Nicolas Queide para o todo o sempre,
Jaciara Macedo