terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Child of Galileo.

"A noite acendeu as estrelas porque tinha medo da própria escuridão."
Mário Quintana


Os cientistas dizem que se você puder arranjar um jeito de viajar mais rápido do que a luz, poderá ir para qualquer lugar do universo que desejar em questão de segundos. O universo inteiro, que sempre tem algo novo a mostrar já que está em constante expansão. Eu sempre amei as estrelas por não ter medo do escuro, ou talvez por elas serem as únicas luzes que eu via na escuridão dentro de mim. Minhas palavras geralmente não se fazem entender a quase todos, mas me satisfazem quanto a diminuir o grande ruído que o silêncio alheio do mundo deixa em minha mente. É tão difícil estar constantemente insatisfeita com um monte de coisas que optei por não dividir nada mais a meu respeito com qualquer um. Eu não me importo comigo tanto quanto deveria, ou tanto quanto me importo com o bem estar dos que gosto. Talvez por que alguns vêm para este mundo com o objetivo de cuidar de pessoas, e outros vêm para serem receptores desse cuidado. Algumas coisas às vezes me parecem tão fora de foco quanto um óculos sujo que precisa ser limpo para devolver novamente a visão perfeita. Passado, presente e futuro se embaralham na minha cabeça num ritmo frenético como uma constante explosão estelar fazendo um barulho insuportável, embora que para os outros eu esteja em completo silêncio. Einstein dizia que imaginação era mais importante do que conhecimento, no entanto eu acho que bem no fundo ele sabia que se você tiver conhecimento e imaginação, você pode mudar o mundo. Ou talvez só o mundo de algumas pessoas. Eu sonho sobre galáxias, supernovas, nebulosas e milhões de outras coisas que não estão ao meu alcance e talvez jamais estejam, mas tudo bem. Pelo menos estou viva. Pelo menos eu posso criar, pelo menos posso imaginar. Pelo menos minha mente não fica estagnada. Pelo menos eu ainda consigo amar, mesmo do meu jeito estranho. E é só uma questão de tempo e de sorte para que as Moiras que tecem minha existência resolvam colocá-la no caminho certo. Dançarei sozinha entre as estrelas enquanto a minha música ainda tocar, esperando que algum dia minha mente permaneça no mesmo silêncio do que o resto do universo.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

The death and the rise of my best friend.


Há um ditado alemão que diz: "Mudar e melhorar são duas coisas diferentes." Muito provavelmente não seja completamente perceptível, principalmente para quem muda, tal alteração. Eu tinha um melhor amigo, não há muito tempo, que era uma das pessoas mais importantes da minha vida. Ele foi minha única família, meu único porto seguro, meu único lar quando todo o resto do mundo parecia fechar os olhos para mim igual aos macacos que não vêem, não ouvem e não falam. Ele pareceu escapar da minha mão tão maleavelmente quanto gelatina, e eu apenas o vi escorrer e se tornar alguém que não conheço, que não reconheço. A vida vai passando na sua frente e transformando as pessoas nas coisas que elas mais detestavam nos outros, sem que você possa fazer nada para evitar. E talvez porque eu sinta uma falta desesperadora dele, isso tem uma proporção maior para mim do que qualquer outra coisa. Meu melhor amigo era a melhor e mais inteligente pessoa que eu conhecera no mundo inteiro. Ele, assim como eu, estava à frente do seu tempo, o que foi um dos motivos pelos quais eu achava que nosso encontro já fora premeditado e escrito nas linhas do tempo bem antes de nossos nascimentos. E apesar de me sentir mais egoísta do que já sou naturalmente, eu queria poder ver o amigo que tanto amei outra vez, algum dia. Por que eu sei que ele ainda está lá dentro dele, e aparece de vez em quando mesmo sem que ele perceba. E é ele, o outro ele com quem eu dividi um dos melhores tempos da minha vida, que eu queria ter de volta. O outro ele que nunca me magoaria dizendo coisas que o atual ele reproduz. O outro ele pra quem eu contei coisas da minha vida que eu nunca tinha contado pra ninguém, sem esperar nada em troca a não ser lealdade. O outro ele com quem eu conseguia ter uma conversa normal sobre qualquer coisa sem que esse atual ele fizesse uma piada idiota a cada trinta segundos. Na maior parte do tempo eu vejo as coisas como temporárias e com prazo de validade definidos, mas nunca imaginei que pudesse imaginar isso na nossa amizade. Na minha imaginação sem limites seríamos amigos até ficarmos velhos brigando até mesmo pela posição de um porta retrato, mas eu não sei se consigo lidar com essa nova pessoa que ele se tornou. Esse novo ele está expulsando de mim todo o amor e carinho que eu sempre senti pelo meu velho melhor amigo, e eu não sinto a mínima vontade de lutar contra. Ainda há algo dentro de mim que me diz que isso não é uma causa perdida, que não é em vão, que assim como as águas de um rio, tudo segue o seu curso, tudo muda. A última pergunta a se fazer é não estou lamentando sobre a alma de alguém que não vai mais voltar, de lembranças que nunca serão as mesmas, de momentos que eu nunca mais terei. 

Música do post: Uno - Muse

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Last blues in Paris.


Depois de muitos anos perdidos e encontrados, depois de muitos sacrifícios e poucos ganhos que a vida lhe proporcionara – ou deixou de proporcionar – o momento que a conduzia ao começo ou ao fim de sua vida finalmente havia chegado. Seus dedos deslizavam sobre a borda de seu copo quase sem mais uísque enquanto seus olhos fechados mantinham sua mente deliciando a agradável voz que cantava no palco à sua frente quando uma mão pousou sobre seu ombro.

– Srta. Juno? – disse o maître. – Perdão, mas seu acompanhante acaba de chegar.
– Creio que ela não necessita adivinhar quem sou, não é mesmo? – disse o homem, surgindo atrás do gentil funcionário.
– Obrigada, George – agradeceu Juno ao bom empregado do restaurante.
– Por que você quis me encontrar neste restaurante tão velho e nostálgico? – reclamou o homem. – Você sabe que detesto esse tipo de lugar. Está me escutando?
– Sim  –  falou Juno, escapando de mais um devaneio. 
– Garçom – estendeu ele a mão, para ser servido. – Mais um uísque puro para a senhorita e um uísque duplo para mim. O mais rápido possível. Juno – prosseguiu, voltando seu foco para a moça. – Eu não tenho muito tempo. O que você quer?
– Você quer dançar? – perguntou ela.
– Não. Diga logo o que quer, e não esqueça que amanhã temos que ir à festa dos meus pais. E que vestido é esse que está usando? Verde? Você nem ao menos gosta da cor verde. Posso considerá-lo no mínimo impróprio.
– Há quanto tempo estamos juntos?
– Desde que éramos adolescentes, obviamente. Você sabe disto, Juno.
– Estão cantando The Doors. Vamos dançar, você adora Jim Morrison.
– Juno.
– Eu amei você durante toda a minha vida, e tenho certeza de que vou amar até meu último suspiro. E é por isso que comprei uma passagem para fora de Paris, com data para amanhã. 
– O quê você quer dizer? – o moço parecia demasiadamente confuso.
– Eu estou dizendo adeus, querido. 

Seguindo o término da música do cantor sessentista, a conversa dos dois entraram num profundo estado de silêncio mútuo. O homem tomou o resto de uísque que havia em seu copo e deu um breve e desacreditado riso. 

– Eu fui tão mal assim?
– Você foi você. – disse ela. – E eu não ousaria pedir que você fosse diferente. Eu não posso fazer isso, nunca pude. Só você. Você que deixou de ser o menino que me amava e virou alguém que não conheço mais. Não posso passar o resto da minha vida esperando que você cresça. Eu te amo, mas não suporto quem você se tornou. Pessoas mudam, apenas isso.      
– Não seja tola – disse ele, deslizando seus dedos pelo pulso dela até a palma de sua mão. – Não vou desistir de você, Juno.
–  Sei que não vai. E sei também que isso não será o fim de mundo para você. Pra nenhum de nós. É só um caminho alternativo. 
– Reconheço este lugar – disse ele, como se fosse atingido por uma lembrança extremamente vívida. – Nosso baile de formatura do colegial foi aqui, não foi?
– Sim  –  sorriu Juno. – Por isso quis vir aqui. A primeira vez que dançamos juntos foi neste salão.

Assim como o destino lhe unira muitos anos atrás, agora os separaria. Os últimos passos dados naquele chão seriam a única prova e marca que vossa junção deixaria no mundo, além de todas as lembranças guardadas dentro deles mesmos. Talvez se vissem daqui há alguns anos, ambos casados com pessoas avulsas e talvez não se vissem nunca mais. Um campo inteiro de possibilidades e de coisas impossíveis que não passavam de mera rotina para eles. 

– Dança comigo? – perguntou ele.
– Sempre.

Uma suave voz feminina começou a cantar e todos os outros corpos no salão pareceram desaparecer. Remember me, don't ever forget me child... We all are only here...

– Eu fiz você feliz?
– Sempre, querido. 
– Há algo mais?
– Há tanta coisa que eu queria dizer, tanta coisa... Mas não importa. Não mais. 

Yes, I did know you were tired and you want to be free... I need someone to stand just right by me...

– Não se vá, Juno. Faço qualquer coisa.
– Você precisa tanto deste afastamento quanto eu. Tudo ficará bem, querido. Tudo ficará bem. Você e eu, sempre ficaremos bem.

Juno entrelaçou seus braços no pescoço dele e sentiu pela última vez o cheiro que sempre foi o seu favorito. Odiava tanto a partida, precisava tanto da partida. Eles eram almas perdidas que se encontraram com a missão de salvar um ao outro, e assim fizeram. Um mais do que o outro, talvez, mas com igual importância. I need your love, I need you to walk all day and all night... Remember me, don't ever forget me child...

– Obrigado, por tudo. –  disse ele.
– Sempre vou lembrar de você ao ver Lynx no céu.
– Está na hora.
– Eu sei.
– Eu vou te amar para sempre.
– Eu sei.
– Tchau, Juno.
– Diga adeus. 
– Adeus.
– Lembre-se de mim, querido. Lembre-se de mim.
– Você e eu somos para sempre, Juno. 

Por que ambos sabiam que haveria uma dança a mais esperando por eles em algum lugar do tempo e espaço, mais uma vez, só mais uma vez até o infinito. 

Música do (e que é citada no) post: Remember Me - Cat Power

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Pink ego box

"O seu único dom era conhecer as criaturas quase por instinto."
Virginia Woolf


Um dos meus maiores defeitos sempre foi achar que a maioria das pessoas ao meu redor e as que observo são nada mais do que um bando de idiotas que não conseguem enxergar fora da caixa. Por isso eu considero especiais todas as pessoas que conseguem me surpreender em algum aspecto. Por que de alguma forma, elas me tocam e eu as toco também. Uma troca justa entre absorver conhecimento e histórias de vida e tempo meu doado. Mas tem dias em que eu acordo detestando tanto o mundo, tanto as pessoas que nele vivem que acho que a única pessoa que pode me satisfazer pessoalmente e intelectualmente sou eu mesma. Tenho mania de sempre achar defeito nos outros, nas coisas, no que me tornei. E tudo o que eu sempre quis foi ser normal. Tudo seria tão mais fácil se eu fosse como as pessoas ao meu redor e não me sentisse tão uma estranha no ninho. Mas quem quer ser normal quando pode ser brilhante? Quem quer ser menos quando pode ser mais, muito mais? O que faz com que eu me sinta cada vez mais sozinha. Sozinha por que parece que rodo sempre em círculos quando a questão é pessoas as quais faço de tudo para não magoar, mas que não se importam em fazer o mesmo comigo. Por que eu tenho que ter tantas expectativas sobres os outros e sobre mim mesma? Porque tudo não pode ser simplesmente leve e natural? Por que as pessoas não podem parar de ser tão estúpidas? Respostas que temo nunca obter. Sempre parece que vago entre o entendimento completo de mim mesma e uma perfeita imensidão de desconhecimento e falta de essência, um enigma eterno que se formou em mim e que não consigo decifrar. O mundo, os lugares e até mesmo eu mudei. No entanto, as pessoas que conheço parecem estar cada vez mais mesquinhas do que nunca. Minha sorte não sai nunca do ponteiro zero e minhas oportunidades continuam num baú afundado no meio do Atlântico. Eu sinto como se estivesse morta a maior parte do tempo, querendo seguir em frente, mas continuando presa ao passado. Não posso tocá-lo, não posso sentir seu cheiro, não posso segurar sua mão quando estiver com medo. Isso não é viver. É ser fantasma de alguém que nunca lhe pertenceu, uma lápide velha e encoberta por arbustos que ninguém mais visita. Minha vida é um quarto entupido de quases em meio a lembranças que nunca aconteceram, camuflado com uma paciência que nunca tive e risos que não parecem meus. Olhar não é ver, assim como gostar não é amar. E é por isso que eu os vejo, é por isso que continuo amando-os. Eu amo vossos temperamentos malucos, vossos egos, vossos dias ruins. Eu amo você e sua incapacidade de ver o mundo além do seu umbigo. Algo me diz que mudanças estão por vir, assim como outras milhares de notícias baratas sobre fins de mundos. Digo-te que posso ver muito além do horizonte se você também conseguir enxergar por cima dos anos e do que considera impossível. Seja o número um.