sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

The Depression Diaries, nº 30 - Trip, pt 1

Hoje faz um pouco mais de dez dias desde que cheguei no RJ pra conhecer meus melhores amigos há quase cinco anos, que eu só conhecia virtualmente. Eu estava feliz, não vou negar. Todas as pessoas daqui todos os meus amigos me recebendo tão bem, parecendo tão contentes em ver me fez muito bem. Pelo menos durante certo tempo. Não que eu não consiga sentir isso ainda, não me entenda mal. O problema não são os outros, sou eu. Sou sempre eu. Eu que não sei funcionar direito. Houve momentos em que eu pensei que todas as minhas doenças podiam ser curadas simplesmente pela presença e pelo carinho dos meus amigos daqui, que mal lembravam a displicência dos meus ~amigos~ de lá, e que pareciam ser a coisa mais extraordinária do universo. Mas não é bem assim. Eu queria muito conseguir fingir que sou normal, que não preciso de remédios controlados pra conseguir sair da cama e ter algum ânimo; mas eu não consigo. Eu não sou assim. Eu me sinto tão envergonhada pelo fato de não poder ser 100% eu e aproveitar 100% das coisas por causa da porra dessa doença. Disso então nasce o desejo de me controlar, de me forçar a sentir isso e não aquilo, de não querer sair correndo na primeira situação desconfortável que me colocam sem saber. Eu falo com meus pais no telefone dizendo que sim estou bem tudo está bem e depois me olho no espelho encarando minha eu interna que quer gritar e correr pra casa. Todas as amizades são um countdown, todas as falsas caras cada vez me parecem mais apropriadas. Não sei se sei mais ser eu por mais de um dia.

"Some days I woke up and got out of bed and brushed my teeth like any normal human being; some days I woke up and lay in bed and looked at the ceiling and wondered what the hell the point was of getting out of bed and brushing my teeth like any normal human being."
Ned Vizzini, It's Kind of a Funny Story

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

The Depression Diaries, nº 29 - The sinking man

Antes de ontem eu fiquei com inveja de uma pessoa que estava em coma no hospital. EU FIQUEI COM INVEJA. Como que minha vida chegou nesse ponto? A pior coisa de estar em momentos ruins da vida é que você não consegue lembrar como era viver antes deles. Eu não tenho a mínima ideia do que fazer da vida. Da minha vida. A vontade de morrer tá atingindo assim níveis estratosféricos. Eu tou fodida na faculdade. Não sei de nada, nada sobre nada e não quero que minha mente saiba de nada. Eu estou me despedaçando, quebrando aos poucos cada parte de mim que compõe tudo o que eu sou.



segunda-feira, 24 de novembro de 2014

The Depression Diaries, nº 28 - Sobre banheiros e o que não foi dito

Eu não sei expressar minhas palavras faladas do mesmo jeito que expresso minhas palavras escritas aqui e em outros lugares. Meu cérebro para de funcionar direito e eu me sinto falsa, tão falsa quanto uma nota de trinta reais. Tudo que sai da minha boca parece mentira, parece drama, parece forçado. E eu estou muito cansada, mas muito mesmo. É muito repetitivo dizer isso, mas parece ninguém consegue perceber. Outra vez, aqui estou tendo expectativas sobre os outros e suas vidas que claramente são mais importantes que eu. Eu não gosto de perder meu tempo, nem tenho mais discernimento pra isso. 

Há sempre um momento, um momento que muda tudo. Aquele momento em que você começa a ver as coisas diferentes, do jeito que elas realmente são. O mundo passa ser só mais uma pintura triste na parede de um museu, tudo perde a cor no exato momento que a verdade é jogada na sua cara. Eu acho que eu devo ser uma pessoa muito entediante pra só servir pras minhas amizades como ouvinte das suas vidas sociais e amorosas e dando comentários sarcásticos sobre. Mas eu não sei mais ser essa pessoa, essa amiga. Não por que eu não goste mais das minhas amizades, mas sim por que eu não sou prioridade na vida deles e pra falar a verdade acho que nunca fui. Essa é a mais longa das crises que eu já tive (está aí desde o final de setembro) e eu simplesmente não me importo mais com nada que não seja conseguir sobreviver a cada dia que tenho que sair de casa. Eu não tenho mais tempo pra ninguém que não queira me dar suporte. Foda-se se eu estou sendo egoísta, eu não dou a mínima. Eu sou minha prioridade no momento, e não tenho mais tempo nem paciência pra dizer que estou bem quando claramente não estou.

Eu sei que eu não falo muito. Sei que meu primeiro ato é me afastar, é me isolar. Não confunda minha auto defesa com desdenho pois não é. Mas eu acho que, no fim, tudo se resume ao não se importar. Ao não ver esse lado negro de mim que assusta muita gente, e poucos conseguem ainda se manter ao meu lado depois de vê-lo. Cada vez que eu desejo ter amigos novos eu sou lembrada de que sou instável como uma bomba relógio, que as pessoas não sabem lidar com minha doença e provavelmente, como os outros, vão se afastar. 

Tá todo mundo tão cansado dessa minha escuridão que provavelmente ninguém lê nem o que eu escrevo aqui. Eu tento escrever o que eu não consigo falar na tentativa de esclarecer os pontos mais confusos da minha personalidade e da minha vida. Eu sempre vou escrever. E certamente vou deixar de falar muita coisa. E vou fingir estar mexendo no meu celular todas as vezes que eu perceber uma tentativa de interação. Eu só queria que as pessoas não desistissem tão fácil de mim. O fato de que não me restou nenhuma amizade nessa cidade é triste e ao mesmo tempo libertador. Mas, em geral, triste. Você não deixa de amar as pessoas assim da noite para o dia. Acredite, eu tentei. Pedaços do seu coração são roubados e levam um tempo para se regenerarem. Eu vou continuar me importando, mesmo que seja tolo da minha parte. Por um lado é difícil ficar sozinha, porém uma parte de mim fica satisfeita ao ver que não arrastei pessoas que amo para esse poço de tristeza e ansiedade que me tornei; coberta de ansiolíticos, antidepressivos e remédios pra conseguir dormir. Minha inveja reside nisso mesmo, de ver os outros contentes e não conseguir sentir o essa felicidade também. Estou protegendo vocês também quando me afasto, quando finjo que não os conheço. Não há forças no mundo que eu não tenha tentado invocar para manter o que eu achava que era, para ser alguém normal. Assim como não há forças poderosas suficientes no mundo que me façam chegar naquele banheiro. O universo é tão grande e eu sou tão pequena, em todos os sentidos. Eu quero querer viver, eu quero não ter medo de arruinar a vida dos meus amigos e da minha família, eu quero ser contente comigo mesma. Eu quero tanto conseguir me amar e conseguir voltar a acreditar nas coisas e nas pessoas novamente. Eu quero andar sobre novas terras, novos planetas, novas galáxias, novos mundos paralelos nos quais eu encontre um eu que é tudo que o meu eu não conseguir ser. Eu quero ser feliz de novo. 

domingo, 12 de outubro de 2014

The Depression Diaries, nº 27 - Ansiedade e outros infartos

Viver com ansiedade é viver com medo. Eu tenho medo de sair da cama, tenho medo de não conseguir sair de casa, tenho medo de não conseguir tomar um banho. Tenho medo quando meu celular toca e eu tenho que falar com alguém. Tenho medo quando as pessoas tentam fazer contato físico comigo, tenho medo quando me pedem pra fazer algo, tenho medo de dizer que tou mal quando me perguntam se eu estou bem. E digo que estou bem. Tenho medo de pegar um ônibus e ele não ser o certo, tenho medo de pedir ajuda, tenho medo de não conseguir terminar a faculdade por causa dos meus problemas mentais, tenho medo de não ter mais nenhum amigo com quem contar nessa cidade. Tenho medo de entrar em um relacionamento com alguém e acabar destruindo tudo do pior jeito possível, tenho medo de nunca conseguir sair daqui porque eu sempre vou estar acompanhada dessas doenças que não me deixam viver 100% da minha vida. Tenho medo de ter um infarte aos 21 anos de idade por que às vezes minha ansiedade fica tão forte que meu peito dói como se eu tivesse tendo um. Tenho medo de fazer novos amigos, tenho medo de ficar pra trás, tenho medo de continuar vendo minha mãe sofrer a cada vez que tenho um ataque de pânico ou uma crise de choro. Eu vivo num constante estado de medo como um soldado numa guerra, esperando um bombardeio a qualquer minuto do dia. O fechamento é pra proteger os outros, pra que não haja morte que não seja a minha, de novo e de novo todos os dias. O egoísmo das pessoas sempre está em achar que minha morte é em função delas; por causa delas, por que ELAS fizeram alguma coisa. Eu só sou uma soldado no fronte da pior batalha de todas tentando sobreviver, tentando morrer e sobreviver, tentando ainda ser eu quando a guerra acabar. Mas não sei se ainda acredito que ela terá um fim.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

The Depression Diaries, nº 26 - Stupid little girl with stupid dreams

Às vezes imagino o que as pessoas que convivem comigo na vida real pensam de mim; de como ajo, de como respondo às coisas, de como sou. Depois de tanto tempo, provavelmente já se acostumaram a me ver triste e assumem que é uma coisa que vou superar sozinha.

Talvez.

Não porque eu não preciso da ajuda de ninguém, mas porque me acostumei a não ter a ajuda de ninguém. 

Às vezes eu penso que eu só queria poder ter com quem falar. Com quem conseguir falar. 
Garota estúpida com estúpidos sonhos que nunca aprende.




"With such a hell in your heart and your head, how can you live? How can you love?"
 Fyodor Dostoevsky, The Brothers Karamazov 

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

The Depression Diaries, nº 25 - Piada

Eu sou uma piada. Minha doença é uma piada, uma história que se conta aos outros pra eles se sentirem melhores quando algo de ruim acontece com eles. Sou uma piada de quem não tem a mínima disposição de me entender e prefere achar que tudo é sobre eles, por causa deles quando tou na mais profunda merda desse poço. "EU fiz alguma coisa pra ti? EU tenho alguma culpa?" Puta que pariu, se tem uma coisa que eu me importo menos nesse momento é com as coisas que os outros fazem. Eu não dou a mínima, e é recíproco. Cada vez mais me sinto uma decoração de sala que as pessoas já estão acostumadas a ver e ignorar. Mas as piadas sempre aparecem. Tanto no meu círculo social quanto dos meus próprios psiquiatras. Só posso ser eu a porra da culpada por ser tão imbecil assim. O bom mesmo é que eu não tenho mais nenhum amigo nessa cidade e devo um total de 0 satisfações. Era só uma questão de tempo até todo mundo ir embora.

segunda-feira, 1 de setembro de 2014

The Depression Diaries, nº 24 - Fake plastic me

É muito difícil estar sozinha. É alguma coisa que eu não sei mais, mas que só sinto. Esse vazio que procuro quando tenho que me lembrar do porque tou sobrevivendo a isso. Geralmente porque tem pessoas que se importam comigo, que me amam, etc. Se eles tem medo de conviver comigo nesse estado, imagina eu. Eu queria ser alguém que a presença não fosse tão pesada, alguém que conseguisse expor claramente o que pensa e sente. Mas não sou. Eu consigo escrever, mas a força desse contra ataque é pequena demais, quase inútil. Ninguém me lê mais porque tá cansado de sentir pena de mim, de rir quando eu digo que preferia ter morrido a ter saído de casa. Eu perdi a graça pras outras pessoas, e então elas preparam o terreno pra partir. É difícil, claro. Eu continuo me adaptando, mesmo sem querer, mesmo sem ter nenhum amigo ou parente pra me apoiar de de verdade. Pra quê eu ainda não sei, talvez eu descubra. Ou não. Depois de um certo tempo não há mais palavras para serem ditas. Todos os pedidos de ajuda se desvanecem e eu também, e eu também.

domingo, 31 de agosto de 2014

The Depression Diaries, nº 23 - Entendimento

Eu fui a outro psiquiatra essa semana. Eu chorei bastante, coisa que eu nunca fiz em nenhuma outra consulta. Não que esse cara seja melhor que todos os outros — ele era a porra dum hipster. Mas eu não consegui me controlar. Depois de algum tempo ele olhou na minha cara e disse "sabe o que você tem? NADA".

Sim, ele disse isso. E me receitou um remédio. E disse pra eu repetir que não queria sentir tais sentimentos ruins quando os dito cujo aparecessem. Claro, porque eu não tinha tentado isso antes. Que porra de pessoa brilhante que você é.

Enfim, eu resolvi tomar o remédio depois de minha mãe insistir. Tomo quando me sinto mal, quando dá vontade, etc. Não que eu me importe.

Porra, eu tou tão cansada de me importar. De tudo. Das pessoas que não dão a mínima. De quem dá a mínima, ou a máxima. Não, ninguém dá a máxima. Eles não se importam tanto pra isso. Eu devo ter criado essa casca de pessoa tão assustadora que ninguém tem ao menos a coragem de perguntar como eu tou sobrevivendo a tudo isso. Porra, é disso o que mais reclamo aqui. Reclamo porque não tenho mais força de vontade de dialogar sobre isso pessoalmente, mas queria que insistissem. Eu não sei o que as pessoas acham quando estou tendo um momento feliz (aparentemente sim esses minutos me curaram duma depressão de 2 anos, você é um gênio), mas é como se fosse um retrato que eles mantém em seus cérebros pra evitar pensar que eu provavelmente fico querendo morrer em todos os outros momentos.

É díficil pra caralho aparentemente me querer por perto, e olha só que bela descoberta é que eu não tenho amigos a esse nível. Por um lado é bom porque nada nem ninguém me prende aqui, e eu tou tão sufocada daqui que não sei como não explodi tudo. Eu preciso me tratar, eu sei. Mas é tão dificil e doloroso admitir que eu preciso de remédios pra não me sentir o pior ser humano que já passou sobre essa terra que tira todo o controle que eu achei que tinha de mim. Eu não quero ser dependente disso pra ser eu mesma. Eu quero não sentir, não ver, não pensar, não ser. Não ser eu. Ser a pessoa que meus amigos acham que sou, a pessoa que intimida, a pessoa auto suficiente, que é difícil de fazer amigos e não se dá bem com todo mundo. A pessoa que não gosta dos amigos deles, a pessoa que eles queiram chamar pra sair ou só ficar por perto sem medo de entrarem num ciclo de culpa porque eu tenho uma doença. Às vezes eu queria tanto pedir a ajuda deles, de alguém, mas eu simplesmente não sei como. O que eles poderiam fazer pra me ajudar? Sentir pena de mim? Se afastar porque acham que eu lido melhor com essas crises sozinha porque certamente ninguém tem coragem de buscar um tratamento para uma coisa que não há provas concretas que existe?

Mas como eu já disse milhares de vezes, eu continuo esperando muito de quem não pretende mais me dar nem um pouco. Essa é minha sina e minha ruína. Entretanto, eu realmente queria ter alguém por perto que entendesse. Que estivesse disposta. Que só existisse, entendendo.

Continue sonhando, gafanhoto. 

domingo, 17 de agosto de 2014

The Depression Diaries, nº22 - Aniversário

Eu venho odiado meus aniversários desde a minha adolescência. Engraçado reler esse texto meu de quando eu tinha 17 anos e perceber que não mudou muita coisa em relação a isso (desculpa, eu do passado). Eu me sinto pior que a merda do pior e mais feio animal do mundo e sabe por que? Segura essa, eu do passado, hora de esclarecer suas dúvidas. É por que finalmente entendo o meu baixo nível de significância na vida das pessoas da minha vida real. Talvez eles nem mesmo saibam isso, mas eu certamente consigo ver. Eu vejo tudo, eu observo tudo. Mas tá tudo bem, não tem problema. Sério. Eu, mais uma vez e segundo as probabilidades, devo sobreviver a esse dia e continuar sendo miserável. Que na verdade é culpa minha. Eu, que espero muita coisa e que crio muita coisa na minha cabeça e arruíno tudo antes mesmo da coisa acontecer, e esperar mais das pessoas do que elas tão dispostas a oferecer tem sido minha desgraça em todos esses malditos 21 anos da minha vida. Eu tenho que parar de criar histórias na minha cabeça, eu tenho que parar de esperar. Apenas. Eu não sou nem tão boa pessoa assim. Jesus, eu queria ter sonífero nessa casa pra passar esse dia inteiro dormindo. Eu odeio pra caralho tudo isso.

(inclusive, eu fui a um psiquiatra novo. ele é um velho imbecil, espero que se engasgue no próprio cuspe.)

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

The Depression Diaries, nº21 - Contágio

Às vezes eu queria que depressão fosse contagiosa. Não só pelo fato de eu ser uma pessoa bem pouco altruísta, mas também porque se essa doença fosse transmissível tão fácil assim, duvido que ainda haveria alguém com coragem de dizer que ela não existe.

Por que existe. E mata, muito. Mata não somente no sentido final da coisa (morte definitiva quero dizer), mas mata aos poucos, como qualquer outra doença por aí. Te mata lentamente quando você ouve um "se anime" ou "você não precisa ficar assim", te mata quando as pessoas acham que é preguiçosa porque simplesmente não consegue levantar da cama durante dias sem achar que seus pés vão quebrar ao tocarem no chão. Te mata bem aos poucos quando você vê seus amigos indo embora, por falta de paciência, por falta de compreensão ou vontade para isso. Te mata, te rasga, te estraçalha por dentro não conseguir formar relações por medo de destruir a outra pessoa com sua doença.

Há essas vozes na minha cabeça que usam minha própria voz para me dizer coisas que eu acabo acreditando, e muitas delas são para que eu desista logo. Mas eu não aceito ordens de ninguém. Somente quando vem o vácuo, o sufoco que não incomoda, não mais. Nesses momentos sim eu penso em desistir. A pior parte de morrer certamente será se houver uma porra de vida após a morte. Puta que pariu meu amigo, não me vem com essa não. Eu só pretendo continuar morta para todo o sempre sem viver nem fazer nada, pois já me bastou essa vida. Enfie no seu rabo essa merda de evolução espiritual, eu não quero merda nenhuma. 

Eu não sei mais se existe uma cura pra depressão. Se fosse um vírus, pelo menos haveria uma chance de conseguir fabricar uma vacina contra ela. Porra, de todas as doenças do mundo que eu poderia ter, claro que eu tive logo a que ninguém acredita que existe e que me faz definhar. E ela está tomando tudo o que eu tenho, mesmo com todas as batalhas que tenho travado e ganhado. Eu sinto como se estivesse tentando enxergar minha figura num espelho trincado, que expõe todas as facetas que eu poderia assumir se soubesse qual delas sou eu de verdade. Mas não sou eu, o rosto não é meu, a pele não é minha; eu habito esse corpo, esse universo sem saber porquê. A percepção da realidade está cada vez mais onírica — uma existência provida de um sonho dessaturado e frio. 

Mas no sentimento de todas as dores do mundo que habitam meu peito eu sou real, e tento me enganar dizendo que posso ser feliz. Não que ninguém se importe, claro. Eu sou a garota que está sempre desaparecendo.


segunda-feira, 7 de julho de 2014

The Depression Diaries, n° 20 - Progresso

Há coisas boas na vida. Um ano atrás, eu não conseguia ver tais coisas. Dois anos atrás, eu queria tanto morrer que quase fui atropelada 5 vezes num só mês e tomei um porre tão grande que só não fiz merda maior porque tinha amigos comigo. Hoje, nesse momento, às 1h22 da manhã, eu sei que existem coisas boas na vida. Sei que existem pessoas boas na vida que se importam comigo e que eu tenho sorte de tê-las. Eu só não consigo enfiar na minha cabeça que eu sou merecedora de todas essas coisas e pessoas. Eu não tenho a mínima ideia de como conseguir isso. Toda fração de felicidade que tenho não dura muito quando minha mente se invade de pensamentos negativos. Como se luta contra si mesmo sem enlouquecer? Eu não sei. Às vezes essas perguntas fritam meu cérebro. Aí então eu torço pra que isso seja temporário, coisa só da juventude. Eu quero conseguir encontrar uma forma de ser feliz comigo mesma, eu preciso. Todas essas coisas boas da vida esperam por mim, pra que eu consiga não ser e ter mais esse peso. Eu choro hoje porque eu quero encontrar uma saída dessa doença, porque quero ser melhor. Nesses três anos eu passei por muitos momentos difíceis, e apesar de muita gente não me entender bem, sempre estiveram comigo nos momentos em que se preocuparam quando sumi por alguns dias, quando me fizeram rir quando eu tava no fundo do poço, quando me abraçaram enquanto eu chorava, quando eu não conseguia respirar tendo ataque de ansiedade e ficaram do meu lado. Eu quero ser melhor por essas pessoas, e por mim. E por todas as pessoas que ainda vou conhecer e que merecem uma versão melhor de mim. Eu estou feliz, hoje, que minha tentativa de tirar minha própria vida anos atrás não funcionou. Eu espero que eu possa continuar contente sobre isso.

sexta-feira, 13 de junho de 2014

So darkness I became

Mais uma vez você se perde, sem saber como chegou ali. Você nunca sabe. Mover-se exige esforço, e logo desiste de buscar forças. Você se toca, arrastando os dedos sobre a pele fria e a roupa áspera, buscando uma confirmação de que aquilo — você — é mesmo real; e é. Suas mãos continuam a conferir, correndo desesperadas por baixo da roupa a procurar seu coração batendo; minhas mãos que deveriam estar lá são apenas uma lembrança. Seu coração ainda bate, você ainda está no mundo dos vivos. O medo que te paralisa continua a repetir mentiras nos seus ouvidos, uma cobra tentando te fazer comer um fruto proibido. Só existe você e ele, na verdade. Você tenta lembrar de mim, mas eu cada vez me torno mais irreal. Eu existi? Suas mãos algum dia realmente me tocaram? Sua mente não tem ideia. Você está se perdendo. Sua visão, escura e sufocante desde o princípio, continua a ser a coisa menos assustadora de tudo. É  um engodo, você pensa. Sua mão vaga pela escuro, flutuando como um destemido peixe em mar aberto, sentindo o ar à sua volta como se pudesse tocar no oxigênio que o mantém vivo. Não há pressa alguma e nem mesmo o peso sobre seu braço o impede de continuar a buscar algo. Não há ninguém para segurar sua mão; não há nada nem ninguém, só você. Você. Você. Você. Eu estou na sua mente, porque você se prende à minha lembrança como se pudesse ter feito algo diferente. Sou sua ilusão favorita, um meio que você criou para partir seu próprio coração. Abra os olhos. E você o faz, mas a escuridão continua lá. Está preso, conclui, quando é exatamente o contrário. Não há nenhuma saída para teu labirinto porque só você pode fazê-lo sumir. A escuridão te encharcou como se você tivesse andado sob um temporal e se tornou parte de você. Não há nada para se temer no abismo que o obscuro finge ser, pois é você. Tudo sempre foi você. Os monstros que você imaginava que pudessem estar ali para te atacar não passam de uma distração de auto sabotagem que te impedem de abraçar o que você realmente é. E então você se movimenta, dançando na sua própria mente na descoberta de que você é dono de si mesmo. Só há escuridão onde você permite sua entrada. A solidão é mais assustadora do que todos os monstros do mundo, ilusões que criamos para não enfrentar a nós mesmos. Meu desejo é que você não se esconda, não mais. A luz no fim do seu túnel não sou eu, mas você mesmo. Você deveria ter escutado quando disseram que pessoas não podem ser o lar de alguém, assim como eu também não posso estar mais nos seus pensamentos às 3 da manhã, não mais. Você brilha forte demais para permanecer escondido na escuridão, e eu só sei ser o monstro que te assombra.

 

domingo, 6 de abril de 2014

Você é

Você é uma ideia. Você é um passatempo, você é um engodo, você é o que minha mente te fez, e por isso você não é você. Nada que não se esperasse da moça com um computador no cérebro, o monstro do médico que voou alto demais e se queimou. Às vezes - a maior parte do tempo - você só existe na minha cabeça, crescendo ao redor das ervas daninhas como se não estivesse destinado a morrer. Você é a ideia dentro do sonho que vive voltando todas as noites, tentando dizer uma mensagem que eu não consigo compreender. Você é tudo aquilo que inventei porque precisava acreditar na humanidade de novo, tão austera e cruel consigo mesma. Quando eles me desligam, eu consigo sonhar com minhas invenções e todas as coisas que não posso esquecer. Então surge você, a qualquer momento, do ponto mais iluminado da minha mente, a criação da criatura que agora se torna mestre de si mesma. Eu sei que você não é real. Você é bom demais pra ser humano, pois ser humano corrompe e aos meus olhos só existem tua perfeição. Em certo tempo de uma certa época, você só existe no mesmo corpo que eu apenas para me manter viva. E talvez, num momento qualquer que devo ter imaginado, você é aquilo que preciso quando me perco nos calabouços tenebrosos da minha mente, pois você sempre me encontra. Você é um Dom Quixote, um kamikaze. Você é, e isso basta por enquanto.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

The Depression Diaries, nº19 - Poema 01



1.
Tenho depressão há 2 anos
e nesse tempo ninguém
ninguém
falou abertamente comigo sobre isso
como um monstro embaixo da cama
que preferimos evitar.

2.
Vá à merda com seu "está depressiva hoje?"
ninguém escolhe quando vai ao inferno
muito menos eu.

3.
Soa confortável fingir que não está ali
que eu não estou ali
que não estou ali daquele jeito
fingir que eu mordo
quando na verdade é minha doença
que me devora por dentro.

4.
Eu não sou minha depressão
eu a tenho presa no meu corpo
esperando o exorcismo necessário
que eu não sei proferir.

5.
Meus olhos estão secos
mas minha alma quer chorar o oceano inteiro
e inundar minha mente de qualquer coisa
que não seja tudo.

6.
Quando eu rezei a qualquer entidade
que minha mente não suportava tanta carga
não era um pedido de acréscimo
era um sinal de desespero
pra continuar a viver
e não ter que morrer todo dia.

7.
Toda vez que me olho no espelho
sinto vontade de chamar a polícia
e reportar o desaparecimento
da pessoa que eu já não sou mais.

8.
O afogamento que fecha minha garganta
vem num ataque de ansiedade
no esquecimento das pessoas
nas ligações que não consigo atender
nas fotos que quero aparecer
pra deixar alguma lembrança da minha passagem
quando eu desvanecer depois dilúvio.

sábado, 25 de janeiro de 2014

The Depression Diaries, nº18 - Après moi, le déluge

Esse mês — não sei bem o dia — faz 2 anos que me encontro em depressão e consigo sim, de algum modo, enxergar uma certa melhora de 2012 pra cá. Na verdade, acho que aprendi a ter mais auto controle; posso desmoronar e ainda assim minha ansiedade vai me manter em pé pra ir trabalhar e estudar. Às vezes eu acho que minha mente vai explodir de tanta informação, de tanta história que só existe na minha cabeça, de tudo que existe e do que não existe também. E fico triste de perceber como tão poucas pessoas conseguem realmente me conhecer. Fico triste também — às vezes — por ser quem sou e não alguém menos complicado, menos eu. Tento dizer a mim mesma que eu não sou as falhas que cometo, que está tudo bem ser assim e que sou merecedora de mais paciência. Respiro fundo e tento não partir meu próprio coração mais uma vez.

Eu queria ter amigos mais próximos. Que em algum momento da vida nenhum pensamento de que minhas amizades realmente não dão a mínima pra mim passasse pela minha cabeça. Eu estou ficando velha e confusa e minhas palavras não saem direito e eu pareço que não ligo sobre ser entendida mas eu quero sim e anseio por aquela conexão que nos faz sentir menos sozinha no mundo, que algum dia tive ou devo ter tido e perdi. Nossa conexões são fios que são trocados quando desgastados, quando roídos pelo tempo ou quando simplesmente perdidos. Continuo acordando todos os dias sozinhas sem dedicar meu amor pra alguém especial e isso me deixa contente de um jeito que me faz sorrir por não ter que mentir pra ninguém. 

Talvez as coisas que não consigo dizer aos outros tolham minha voz cada vez mais entupida de sentimentos não cuspidos. Continuo sendo quieta e observadora e respiro fundo, ansiando sempre o momento que posso chegar em casa e sentar em frente ao computador e esquecer que eu sou eu por algumas horas. Torço pela chegada do dia em que eu não me sinta patética ao contar aos outros sobre mim; quando as palavras saem da minha boca como se fossem linhas mal esboçadas por um escritor de quinta categoria. Eu não acredito em amor à primeira vista mas certamente creio em morte à primeira tristeza, que nos torna quem somos irreversivelmente. Todos os danos são intencionais. 

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

The Depression Diaries, nº17 - 2013: podia ser pior

A cada ano que passa eu sinto que estou perdendo a capacidade de perceber a passagem do tempo de um jeito normal. É como se durante a maior parte do tempo eu oscilasse entre a vida numa cápsula no espaço e uma volta à Terra, à realidade. Esse fluxo se acalma quando chega o fim do ano e me pego pensando mais uma vez "mas já é dezembro?" e um novo ciclo começa. Enquanto isso tenho que treinar todas as vezes como me apresentar durante a socialização e começo sempre com "Meu nome é Jaciara, não, me chame de Jaci por favor eu detesto meu nome completo, e eu tenho vinte anos...", mas não passa disso. Porque todas as coisas que quero contar sobre mim ou são odiosas ou assustadoras, ou simplesmente tediosas. Todo ano passa e com ele passa a esperança que eu tinha que fazer as pazes comigo mesma, de me aceitar como sou através da compreensão. Sinto como se eu tivesse passado por esse ano como uma folha, navegando pelo vento até algum lugar ainda não definido.

Eu tive alguns momentos horríveis durante esse ano, obviamente. A maioria deles provavelmente por causa da depressão, e dos meus ataques de pânico/ansiedade, e certamente também por causa da minha escrotice. Acima de tudo acho que foi um ano que veio pra dar na minha cara e me mandar parar de ter expectativa com as pessoas e as coisas, por que no fim só quem sai decepcionada sou eu mesma e mais ninguém.

É bem provável que eu não aprenda nada com mais esse ano por que a burrice está no meu sangue.

Eu me sinto emocionalmente cansada de tanta coisa que as pessoas me fizeram viver esse ano. E continua surpreendente a capacidade de todos de não levarem a sério as coisas que (poucas vezes) digo sentir. Não há quem me abrace e veja minha alma toda remendada com band-aids, mas sim há o desvio no olhar, o fingimento, a mudança de assunto. Talvez eles estejam com medo de me tocar e me desmontar, sobrando só pedaços que eles não saberiam colocar no lugar de novo. Esse ano eu perdi muita gente na minha vida, ganhei outras, segui em frente. Algumas me decepcionaram e outras viveram comigo momentos incrivelmente felizes que vou guardar na memória até depois de ter morrido e ter virado poeira estelar. Venho aprendido a aceitar os outros e suas falhas e as minhas falhas que ainda continuam; a ser humana e bater minha cabeça na parede quando preciso, contudo sobreviver. 2012 foi um ano tão horrível que não tenho nem coragem de reclamar tanto assim de 2013, que me iniciou na vida adulta com várias tijoladas na cara. Esses dias meus pais comentaram que estavam satisfeitos por eu não estar mais tomando e eu quis dizer "e isso lá quer dizer que estou curada?", mas não disse nada. Também não sei porque. Ter largado os remédios e o psiquiatra foi o chute no pau da barraca que dei, como quando não se sabe nadar e te jogam na piscina: ou você nada — por instinto — ou você morre. Eu estou tentando nadar, e há dias em que quero muito desistir e apenas deixar meu corpo afundar, porém continuo. Por enquanto eu continuo. Continuo tentando não esperar nada, tentando sempre me lembrar das pessoas que amo e que amei, mesmo sem nunca ter dito muito. Às vezes eu fecho meus olhos e vejo tudo o que me aconteceu e o que pode acontecer e só quero gritar, porque eu não quero imaginar nada, não quero criar nada, não sobre mim. Quero só vibrar na mesma frequência do mundo e ouvir minha canção tocar sozinha, em paz. Mas o que foi visto não pode ser esquecido, assim como só se é lembrado se fora enxergado. Pela primeira vez em muitos anos eu estou no caminho certo, temo.